Que melhor forma de falar sobre um tema tão engessado e complexo senão com uma linguagem fora do comum? Os temas lgbtqi+ aparecem muito mais em filmes estrangeiros como parte da cultura, já os nacionais ficam presos numa cartilha do que é aceitável por quem assiste. Mas afinal, quem assiste? Bem, se existem o filmes de heróis, os de guerra, de ação, drama, e outros, nem sempre o público é o mesmo. Com uma grande vantagem, o filme Alice Junior, estreia na melhor plataforma possível para o seu produto, a Netflix. Vasto como seu catálogo, o público conectado conversa mais com essa geração da lacração.
O filme conta a história da adolescente trans, vivida por Anna Calestino Mota, que se muda da grande Recife, onde tem seus amigos e é conhecida pelo seu canal na internet que tem direito até a Gretchen recriando os melhores memes, para o interior de uma cidade no sul do país. Com o apoio total de um pai super parça, Alice começa sua transição oficial, que ajuda muito na sua luta diária contra o dia a dia conturbado de uma trans na sociedade, seja na identificação de um banheiro que ela possa usar, no emprego do nome social ou na aceitação da imagem do seu corpo pelos outros. Todos os temas que envolvem a protagonista, são além de tudo isso, qualquer dilema de alguém na idade dela, como a crush no namorado da amiga, a antecipação do primeiro beijo ou uma festa com a galera da escola.
As redes sociais são usadas como a nova arma do bullying e empregam grande importância na história de Alice, assim como o de seu entorno. A necessidade de ser visto, de compartilhar seus pensamentos e ideias se confundem com as expectativas do mundo real que não se parece nem um pouco com o que se idealiza no escape das redes. A militância do texto mesmo que aparente, segue tão leve e viciante que é impossível se entediar com o filme, mesmo em cenas caricatas como as da diretora da escola católica tradicionalíssima, colocada no filme de propósito. Afinal, um dos maiores opositores da jornada de Alice na nova cidade é justamente a escola.
O visual do filme ganha um toque ainda mais especial com grafismos ao melhor estilo Scott Pilgrim Contra O Mundo, trilha de Pabllo Vittar, Gloria Groove e um look mais legal que o outro, lembrando um pouco a Jules da série Euphoria da HBO. Se a gente for ver de uma forma prática, o filme estaria muito próximo de ser um Sierra Burgers É Uma Loser ou Com Amor, Simom, que coloca uma lupa na minoria sempre vista como vítima e fora do círculo popular, mas diferente desses, o filme, dirigido por Gil Baroni se torna parada obrigatória no catálogo da Netflix e mostra seu valor, com simplicidade num roteiro que soluciona as cenas mais traumáticas da vida de um adolescente com uma lição otimista.