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As memórias de um espaço em “Aqui”

Em Aqui, Robert Zemeckis oferece uma experiência cinematográfica que, apesar de inovadora em conceito, encontra dificuldades em sua execução. Baseado na graphic novel homônima de Richard McGuire, o filme utiliza um único cenário – a sala de estar de uma casa – para narrar décadas de histórias humanas, explorando temas como impermanência e as mudanças inevitáveis ao longo do tempo. Com um elenco de peso liderado por Tom Hanks e Robin Wright, o projeto ambiciona combinar emoção com experimentação, mas nem sempre alcança o equilíbrio.

O filme se destaca pela escolha ousada de manter a câmera fixa na sala, enquanto os anos – e até milênios – passam. Zemeckis, no entanto, opta por abandonar uma linha narrativa linear, embaralhando a cronologia com cortes abruptos e transições estilizadas por meio de quadros sobrepostos, um elemento tirado diretamente da graphic novel. Essa abordagem, embora criativa, muitas vezes dificulta a imersão. Ao invés de permitir que o espectador se conecte profundamente às histórias, as mudanças bruscas no tempo e na narrativa criam uma barreira emocional.

Os eventos que ocupam a maior parte da trama estão concentrados na família Young, cujas gerações habitam a casa entre o final da Segunda Guerra Mundial e os anos 2010. Richard (Tom Hanks), personagem central, é apresentado como um homem comum que vive os altos e baixos de uma vida ordinária: casamento, paternidade e a perda dos pais. Essa simplicidade é a força motriz de Aqui, uma ode às vidas comuns e às memórias que se acumulam em um espaço físico.

O cenário, um personagem por si só, evolui visualmente ao longo do filme. Desde mudanças na decoração até a transição tecnológica de rádios para TVs modernas, cada detalhe reforça a passagem do tempo. Ainda assim, enquanto o espaço da sala é carregado de significado, o próprio filme carece de profundidade narrativa. Por mais que as histórias individuais sejam acessíveis e emocionantes, elas frequentemente perdem força devido às distrações causadas pela estrutura experimental proposta pelo diretor.

Zemeckis reúne a equipe criativa de Forrest Gump, incluindo o roteirista Eric Roth, mas a mágica daquela obra-prima não se repete aqui. O uso de tecnologia de rejuvenescimento digital para Hanks e Wright nem sempre funciona, e o mesmo pode ser dito do ritmo desconjuntado do filme. A sensação de “artificialidade” é menos resultado dos efeitos visuais e mais das escolhas narrativas que continuamente afastam o público.

Apesar das falhas, Aqui tem seus momentos de brilho. Algumas cenas – como a breve e impressionante sequência do fim dos dinossauros – destacam o impacto visual que Zemeckis ainda é capaz de entregar. O filme também acerta ao capturar a beleza na transitoriedade e na conexão humana, mesmo que essas emoções sejam muitas vezes diluídas por um formato que parece mais interessado em surpreender do que em emocionar.

No fim, Aqui é uma experiência curiosa, mas frustrante. O filme tenta inovar, e isso merece reconhecimento, mas a execução não faz jus à ambição do projeto. Ele parece mais adequado a um formato curto, onde a experimentação não comprometeria tanto a narrativa. É uma obra que provoca reflexão, mas, infelizmente, deixa a sensação de que poderia ter sido muito mais.

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