Henrique V, dirigido e estrelado por Laurence Olivier, é uma adaptação vibrante e inventiva da peça homônima de William Shakespeare. A narrativa se debruça sobre o heroísmo e a astúcia do jovem rei inglês (interpretado pelo próprio Olivier) em sua campanha para conquistar a França e consolidar sua posição como líder visionário. Embora seja uma obra de época, o filme transcende o mero espetáculo histórico ao apresentar uma abordagem criativa e acessível, sem perder a essência poética de Shakespeare.
Olivier entrega uma atuação memorável, encarnando o rei com uma mistura de carisma magnético e poder inquietante. Sua presença em cena é hipnotizante, alternando entre o estrategista frio e o orador inspirador que motiva suas tropas antes da icônica Batalha de Agincourt. O contraste entre o charme real e a frieza calculista do monarca é explorado com intensidade, tornando Henrique uma figura ao mesmo tempo admirável e perturbadora.
O filme abre com um recurso engenhoso: uma representação do Globe Theatre do século XVII, onde a peça começa a ser encenada. Essa escolha cria um tom metateatral que aproxima o espectador da obra, destacando tanto a teatralidade quanto a universalidade dos temas apresentados. A direção de arte e os cenários, em Technicolor, são uma colírio para os olhos, com cores suaves e detalhes que evocam um conto de fadas histórico.
Olivier também brilha como diretor, demonstrando uma compreensão aguda do material de origem. Ele equilibra o texto shakespeariano com momentos de leveza e vaudeville, tornando a trama acessível sem comprometer sua profundidade. O uso cuidadoso dos versos de Shakespeare confere uma musicalidade às cenas, enquanto o humor sutil e a coreografia detalhada adicionam dinamismo ao ritmo narrativo.
No entanto, a produção não escapa de certa artificialidade, que, em alguns momentos, diminui seu impacto emocional. O retrato de alguns personagens secundários, como a princesa Katherine (Renée Asherson), é tratado com leveza quase caricatural, o que enfraquece a seriedade de algumas interações. Além disso, o esforço para agradar a um público amplo resulta em uma estética que, por vezes, se aproxima do idealismo juvenil, comprometendo a densidade histórica.
Apesar de suas limitações, Henrique V é uma celebração poderosa da arte de Shakespeare e do talento de Olivier. Combinando espetáculo visual, interpretação magistral e uma adaptação fiel do texto original, o filme permanece uma referência tanto para o cinema quanto para os amantes do teatro. É uma obra que evoca a glória e os dilemas de um líder histórico enquanto celebra a força atemporal das palavras de Shakespeare.
