A Incrível História de Henry Sugar

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"A Incrível História de Henry Sugar": Wes Anderson adapta Roald Dahl em um curta deliciosamente perfeito

É difícil dizer se a sensibilidade de Wes Anderson se adapta perfeitamente à de Roald Dahl ou vice-versa. Seja como for, A Incrível História de Henry Sugar, do autor de O Fantástico Sr. Raposo, parece ter encontrado sua encarnação ideal nas telas pelas mãos do diretor. Mesmo com o curto tempo de duração, é assustadoramente denso, e parece pronto para competir na categoria de melhores curtas do Oscar 2024.

A Incrível História de Henry Sugar é apenas o começo de um projeto maior, com mais três adaptações de Dahl criadas por Anderson – O Cisne, O Caçador de Ratos e Veneno – chegando à Netflix respectivamente de 27 a 30 de outubro, um por dia. Henry Sugar estreia logo depois de Asteroid City e repete a abordagem narrativa estonteante do filme, começando no que parece ser a camada mais externa, com Ralph Fiennes interpretando o próprio autor.

Mais tarde, perceberemos que o filme sabe que se trata de um ator que interpreta Dahl, já que Fiennes também desempenha um segundo papel. Com um leve frescor metatextual astuto, Anderson reconhece a artificialidade de tudo isso, chamando a atenção para os truques usados para saltar entre os locais. Por alguma razão, a presunção de Anderson é que todo o projeto está acontecendo em um estúdio de cinema antigo, com retroprojeção, perspectiva forçada e outros dispositivos empregados para nossa diversão.

Depois que Fiennes, como Dahl, descreve brevemente seu processo de escrita, ele se levanta da cadeira, sai pela porta da frente e começa a recitar sobre o que o filme se trata. O que se segue não são as palavras reais de Dahl, mas a visão de Anderson sobre elas, o que exige uma narração completa enquanto vários personagens passam a contar a história. O Dahl de Fiennes apresenta Henry Sugar (Benedict Cumberbatch), um solteirão rico interessado principalmente em aumentar sua fortuna. Ele se depara com um estranho livro intitulado “Um Relatório Sobre Imdad Kahn: O Homem que Vê sem Usar os Olhos” em sua biblioteca.

Assim que ele abre o livro, a narração muda para um Dr. Chatterjee (Patel, também com dois papéis no filme), lendo seu próprio relatório. Um complemento perfeito para a companhia cada vez maior de atores de Anderson, Ben Kingsley interpreta Kahn, um mágico de rua treinado em ioga que demonstra sua habilidade única a dois médicos céticos. Ansioso para descobrir como Kahn conseguiu dominar essa técnica, Chatterjee interroga Kahn, que em seguida assume as funções de narrador. Agora com quatro níveis de profundidade, a Incrível História de Dahl está começando a parecer O Manuscrito de Saragoça, aquele grande quebra-cabeça no estilo matryoshka, com sua intrincada estrutura de histórias dentro de histórias.

Anderson se permite fazer algumas peripécias ao longo do caminho, uma das quais exige que Cumberbatch se torne um cafona mestre do disfarce. É a maneira como o diretor interpreta Dahl que se mostra mais interessante aqui, pois ele pede ao elenco relativamente pequeno (mas estrelado) do projeto que salte da Inglaterra para a Índia e, mais tarde, para todo o mundo, enquanto rola telas rudimentares dentro e fora do cenário ao redor deles.

Como ele chega a esse momento e para onde vai a partir dele, vai surpreender até os fãs de Dahl, já que o escritor foi acusado de submeter seus personagens a todo tipo de sofrimento. Esta história é diferente, construindo um final feliz, um resultado mais poético. Anderson claramente se deleita com a maneira desnecessariamente complicada como Dahl conta sua fábula: as camadas de narração, o uso da repetição, a estratégia engraçada de contar ao público como ele descobriu a história. Praticamente só falta uma aparição do próprio Anderson, como Alfred Hitchcock costumava fazer para apresentar os episódios de sua série de televisão. Então, novamente, pode-se dizer que ele está presente em todos os frames.

Existe algum diretor trabalhando hoje cujo estilo seja mais visível – ou influente? A estética de Anderson se cristalizou consideravelmente. Sua decisão de enquadrar esta Incrível História em uma proporção quase quadrada apenas concentra nossa atenção em como sua equipe habitual de colaboradores dão vida à sua visão.

Conheça os demais filmes do diretor

Clique nos pôsteres para ler nossa crítica sobre o filme.

TRÊS É DEMAIS
(1998)

OS EXCÊNTRICOS TENEMBAUNS
(2001)

A VIDA MARINHA COM STEVE ZISSOU
(2004)

VIAGEM A DARJEELING
(2007)

O FANTÁSTICO SR. RAPOSO
(2009)

MOONRISE KINGDOM
(2012)

O GRANDE HOTEL BUDAPESTE
(2014)

ILHA DOS CACHORROS
(2018)

A CRÔNICA FRANCESA
(2021)

ASTEROID CITY
(2023)
A INCRÍVEL HISTÓRIA DE HENRY SUGAR
(2023)