O Recepcionista

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O Recepcionista desperdiça o potencial de um bom thriller por descuido de empatia.

Tratar de doenças em produções cinematográficas, podem ter sua dose controversa de retaliação que muitas vezes não é prevista pela arte acima de tudo. Existe sempre a linha entre a responsabilidade narrativa e o tudo pode. Mas é mais fácil do que parece escapar essa marcha e construir um perfeito desastre. Assim como foi feito no remake de Convenção das Bruxas, que trata as crianças como tolas e usa de deformidades corporais para personificar o mal, o novo filme da Netflix, O Recepcionista, faltou a aula de bons modos ao tratar da Síndrome de Asperger com mal gosto.

O filme, escrito e dirigido por Michael Cristofer, conta a história de Bart, um rapaz voyeurista que trabalha na recepção de um hotel e acaba sendo suspeito de um assassinato que ocorre dentro de um dos quartos. Se não fosse pela síndrome, o filme teria todo potencial de suspense de Psicose e Willard juntos. Acontece que o roteiro se descuida nessa questão e concentra a condição de Bart de uma forma não muito confortável. Primeiro pela forma como os colegas de trabalho o tratam, ao dizer “ele é esquisito, mas é um bom sujeito”. Poxa, ainda que se essas falas estivessem direcionadas a uma construção antagônica ou que estabelecesse uma relação a causa de Bart, tudo bem, mas é um recurso muito amador e sem finalidade na construção de uma história que, novamente, tinha muito potencial.

Ora, justificar o voyeurismo por conta da Síndrome de Asperger também é muita covardia e de pouca sensibilidade para o tema. Ou um ou outro. Não havia necessidade de associar as coisas dessa forma e Bart poderia simplesmente ser um cara que fazia uma coisa errada e se redime no final. Também ficou muito manjado a personagem da Ana de Armas ter tanta simpatia pelo recepcionista porque já teve um irmão com a mesma Síndrome. Uma saída muito fácil para conectar os dois personagens.

Em contraponto, Tye Sheridan entrega uma interpretação excepcional e parece entender as problemáticas do filme que topou fazer, tamanho o empenho e carisma em frente a tela. Ana de Armas, a mesma coisa. Faz de sua Andrea mais do que o despertar romântico de Bart e consegue prender o espectador com seu belo e expressivo rosto de musa do cinema dos anos 60. Acontece que nem só das belas atuações o filme é feito. A investigação em torno do assassinato é uma das mais pobres e sem sentido já reproduzidas pelo cinema. O investigador de meia tigela ainda pratica bullying em Bart, dando a entender que o “doente mental” é sempre o depravado, mesmo pesquisando sobre o Asperger. Fica uma situação embaraçosa que compromete todo o resto.

O filme ainda é assistível pela dupla de protagonistas e pelo entretenimento sem compromisso, porque se a gente parar para pensar no resto, vai fazer a gente ter saudade de bons filmes misteriosos de roer as unhas.

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