A Voz Suprema do Blues

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Viola Davis e Chadwick Boseman surpreendem na adaptação da peça de August Wilson

Em A Voz Suprema do Blues (Ma Raine’s Black Botton, no original) as introduções são importantes. Quer o público conheça ou não a reputação de Ma Rainey (conhecida como a Mãe do Blues), a peça de August Wilson pinta esta pioneira musical como uma personagem maior do que a vida, mesmo antes dela pisar no palco.

Mas vamos começar do início.

O ano é 1927 e Ma Rainey (Viola Davis, de Esquadrão Suicida) está contratada para uma sessão de gravação de um álbum, mergulhada em tensão entre seu ambicioso trompista Levee (Chadwick Boseman, nosso eterno Pantera Negra) e a gerência branca que está determinada a controlar a incontrolável “Mãe do Blues”. Porém, uma conversa no local revela verdades que irão abalar a vida de todos.

Afastando-se da peça, o diretor George C. Wolfe abre seu filme com uma breve apresentação de Ma Rainey. Esse vislumbre nos joga na vida de estrelato musical da artista, só para depois tirá-la de sua zona de conforto quando ela precisa confrontar um bando de policiais raivosos (e acima de tudo, brancos).

Davis, que ganhou o Oscar como a esposa durona de Um Limite Entre Nós, outra adaptação de Wilson, parece irreconhecível como Ma Rainey. A atriz se transforma na personagem através de maquiagem e mudança corporal. Mas é na convicção em si mesma que se encontra a espinha dorsal da personagem – a atriz deixa claro que Ma Rainey está longe de ser uma mulher que pode ser pressionada.

Quase cada segundo do desempenho de Davis é sobre poder, sobre quem tem o controle sobre quem e o que significa para uma pessoa – ou quiçá um povo – estar em uma posição subordinada. A adaptação de Ruben Santiago-Hudson explica um pouco desse subtexto, mas a sensibilidade do público varia de acordo com sua experiência de vida.

Mas o filme não é de apenas um talento. Os companheiros de banda de Ma Rainey questionam a ânsia do Levee de Chadwick Boseman para produzir suas próprias músicas e assim, nas entrelinhas, questionam os seus valores. Enquanto isso, Levee se preocupa com uma porta enferrujada no estúdio que se torna um símbolo de suas ambições: é um atalho ou um beco sem saída?

A história da música americana moderna é pavimentada com a apropriação e roubo total da cultura negra. Essa tradição continua até hoje, remontando pelo menos até o momento que Wilson, inspirado no blues, aqui imaginou.

O dramaturgo concebeu Levee como uma figura trágica. E por mais poderosa que seja a performance de Davis, este filme é de Boseman. O nome de Ma Rainey está bem no título, mas Levee rouba seu show a cada cena, portanto faz sentido que nossos olhos estejam sobre ele quando ele começa a implodir. Que sorte que o legado de Boseman inclua este filme, uma homenagem à arte negra que é forte o suficiente para enfrentar os custos de sua produção.

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