Eles Vieram e Roubaram sua Alma

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Para muitos artistas, quando questionados sobre sua força criadora, a resposta está no próprio ato de criar. Produzir algo com as dores e sentimentos pode ser um dos processos mais eficazes como catalisadores. “Eles Vieram e Roubaram sua Alma”, produção de uma equipe gaúcha encabeçada pelo jovem Daniel de Bem, é um resultado sincero de um processo assim, onde o diretor transforma seus anseios em camadas audiovisuais, resultantes em um longa poético.

Mateus (Filipe Rossato) é um típico jovem na casa dos vinte anos, com dúvidas sobre seu futuro, relacionamentos amorosos e familiares. O fato de viver em um subúrbio do Rio Grande do Sul afeta ainda mais suas perspectivas em relação a tudo, a única certeza que ele tem é que precisa terminar o filme que vem rodando há anos com a ajuda de amigos. Com uma velha câmera VHS – que nessa situação perde o conceito vintage e vira zombaria na boca dos amigos – ele filma partes da vida do personagem Hiozer, que se sente como se fosse ser engolido pelo tempo e pela vida, exatamente como Mateus. Há anos que ele tenta fechar o ciclo do filme, mas para tanto precisa tomar decisões para si mesmo, aceitar que o protagonista e ele devem ir adiante.

A imagem tem um poder bastante próprio em “Eles Vieram e Roubaram sua Alma”, sempre colocadas em camadas, bastante sentimentais no sentido de se construírem junto com a narrativa. Seja na velha câmera de Mateus, que graças ao seu amadorismo granulado eleva as imagens ao sentido de memória, seja em movimento, na abstração de uma rodovia ou em um plano estático da natureza bucólica dos pampas. Essa construção de imagens se dá graças à montagem de Daniel com Germano Oliveira, transpondo as diferentes capturas com uma forte trilha sonora, que poderia fazer o espectador viajar por mais algumas horas através desse olhar. Uma das cenas mais bonitas do longa é quando Mateus se vê obrigado a decidir a última cena do filme, saindo de trás da câmera, correndo em linha reta até que a lente não consiga mais capturá-lo.

Na estreia do filme, durante o 5º Olhar de Cinema, Daniel de Bem não temeu na sinceridade de dizer que esse filme é uma parte de si, dos seus sentimentos após terminar a graduação e não se encontrar cheio de perspectivas. Justamente como Mateus, ele se viu na necessidade de criar algo e nessa aventura ao lado de amigos criar uma linguagem própria, encontrando sua identidade como cineasta. “Eles Vieram e Roubaram sua Alma” é uma síntese desse trabalho de busca individual, mas que se dá apenas quando há uma ideia de coletivo que apoia nessa trajetória. Um filme sobre amizade e autoconhecimento usando a imagem como terapia.

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