O ritmo, o balanço, o auge! A Disco Music tem aquela pegada diferente que iniciou todas as batidas e criou um movimento novo misturando técnicas de mixagem e movendo as pessoas para as boates em concursos de dança. A música nasce nas comunidades e ganha o mundo, isso sempre foi assim. A nova série original da Netflix, conta a história de uma Nova Iorque dividida em 1977. Onde os ricos não se misturavam com os negros e os imigrantes e moradores periféricos do Bronx, e o jogo político desfavorecia e marginalizava as comunidades. Numa realidade de vida como essa, um jovem tinha poucas opções, ou era a religião, ou era tomar conta das ruas e provavelmente viver entre a cadeia e o tráfico ou era a música. Por retratar esse período, um dos principais pilares da trama é o sonho e o que esses jovens vão fazer para conquistá-lo.
A série começa acelerada e mal dá para focar no rosto dos personagens e distinguir quem é quem. Além de extenso em proporção cinematográfica, os 90 minutos iniciais, desperdiçam potencial em uma montagem de videoclipe que se esgota logo no começo e a importância da construção e ambientação do clima musical fica cansativo. Na visão do diretor Baz Luhrmann, que também é responsável por Moulin Rouge, Romeu + Julieta e O Grande Gatsby, a série memoriza essa primeira impressão e fica difícil para os diretores dos próximos episódios continuar nessa alucinação. Conforme a trama vai tomando mais forma, as cenas ficam mais complexas e as tomadas mais paradas e focadas no roteiro, deixando os momentos musicais mais isolados e com motivo para acontecer.
Muitas produções do gênero musical se restringem a agradar pessoas do meio e grandes entusiastas de música, ou ainda mais quem está inserido naquele tipo específico de contexto, como foi o caso de Vinyl da HBO. A música é sim universal, mas é preciso unir outras forças para cativar a audiência, coisa que The Get Down não consegue fazer por completo. Mesmo com uma premissa básica, da menina aspirante a estrela que é barrada pela família conservadora até o garoto poeta que tropeça em tentar roubar o coração de sua amada. Talvez um pouco pela inexperiância do elenco principal, que deixa o bonde ser carregado pelo mentor do grupo, Shaolin Fantastic (Shameik Moore), que não só consegue atuar muito bem, mas tem um uso de movimento do corpo em cena que torna cada aparição especial.
É de fazer dançar e cantar em frente da tela ao som das músicas que são escolhidas a dedo para cada momento, em especial a faixa inédita na voz de Christina Aguilera que no último episódio é dublada por uma drag queen. Esse mix de referências não poderia ter um resultado melhor. O clima voguing e a bandeira de liberdade na cena underground LGBT também é uma das definições mais fortes do pop até hoje. Além do som e do bairro, outros personagens importantes para a narrativa são o grafite e a rima. Duas manifestações artísticas que expressam mensagens de esperança e também retratam a realidade vivida no Bronx, com a guerra entre as gangues, os lugares sendo saqueados e territórios marcados.
Na transição da disco para o nascimento do Hip Hop, a série evolui da simples conquista de uma garota, para uma posição perante a sociedade e como os personagens vão se encaixar nesse novo mundo. A importância histórica de The Get Down não pode ser ignorada, mas pelo modo como tudo é apresentado, dá a impressão de estarmos vendo um clipe cheio de referências e detalhes de produção de algum cantor do momento que usa esse período como inspiração para sua arte, mas como roteiro, muitas coisas são esquecíveis.