Trem Noturno Para Lisboa

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“Trem Noturno para Lisboa” soma pontos em remontar um momento histórico interessante da história de Portugal

Até que ponto uma vida pode mudar radicalmente depois de um simples acontecimento numa manhã chuvosa? Na primeira cena de “Trem Noturno para Lisboa” (Night Train to Lisbon, 2013), do dinamarquês Bille August, somos apresentados ao personagem de Gregorius: solitário, rodeado por livros e extremamente metódico. A sequência de fatos que ocorrem num dia chuvoso, uma jovem que tenta suícidio numa ponte, o silêncio dela, o casaco e o livro que a acompanham traçam um futuro incerto ao professor que vê sua vida mudar em pouco tempo. Basta um bilhete de trem para Lisboa para que Gregorius embarque numa história, que mesmo não sendo sua, ele sente a necessidade de compreender até o final.

“Trem Noturno para Lisboa” é baseado no livro homônimo, de Pascal Mercier, pseudônimo do professor de filosofia Peter Bieri que se tornou um autor de best-seller com o título. O livro e o filme trazem a descoberta do professor suíço Gregorius, um homem recém-abandonado pela mulher e com uma vida totalmente planejada e solitária, de uma nova vida através da história de personagens de um livro em português, língua pela qual ele acaba se apaixonando pela sonoridade. Talvez pela poesia que o escritor fictício Amadeu Prado relata sua vida e seus dias durante o difícil período da ditadura de Salazar, ou pela sede de vida e de liberdade que o mesmo relata sua juventude, Gregorius descobre no livro “Um Ourives das Palavras” o seu carpe diem para impulsionar sua própria vida.

O longa é carregado por um clima de thriller – a trilha sonora muitas vezes se apresenta de forma exagerada – apesar do roteiro ter um enredo bastante previsível. Além da belíssima fotografia, “Trem Noturno para Lisboa” também soma pontos em remontar um momento histórico interessante da história de Portugal, o terceiro período – o mais intenso e clandestino da resistência – da ditadura portuguesa, que culminou na Revolução dos Cravos.
A fotografia do filme é belíssima, mostrando Lisboa – e mais adiante trechos da Espanha – através de planos abertos inspiradores, mostrando que Bille August faz jus ao seu currículo que conta com uma Palma de Ouro. Já o time de atores, que realmente é de peso, nomes como Jeremy Irons (que interpreta Gregorius), Christopher Lee e Charlotte Rampling não seguram a estranheza e superficialidade em que os diálogos acontecem. Justamente pela adaptação ao tempo do roteiro, o longa tenta se segurar pela direção de arte, enquanto resvala nos fatos que acontecem de forma rápida demais, sem deixar o espectador criar qualquer tipo de laço. Além de que, o filme estranhamente é falado em inglês – chegando a ser constrangedor o sotaque português de alguns atores -, sendo que acontece entre Suíça, Portugal (na maior parte do tempo) e Espanha, mostrando interesse apenas no cunho comercial, mesmo tratando de um assunto tão particular.

Uma história de solidão, busca pessoal, luta por liberdade e conhecimento histórico sobre os tensos períodos de ditaduras ajudam a definir “Trem Noturno para Lisboa” que bem provavelmente seja mais intenso e perspicaz se lido na versão de Pascal Mercier. Já o longa de Bille August se ajusta bem como um complemento, um tanto novelesco com belos planos, para uma história de auto-conhecimento.

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