As Horas

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Ciclos de vida e silêncios: “As Horas”, um retrato de três mulheres

As Horas, dirigido por Stephen Daldry, é uma meditação poderosa sobre a interconexão entre a expressão e a repressão, explorando as complexidades da mente feminina em momentos cruciais da vida. Inspirado no romance de Michael Cunningham, o filme é um retrato delicado e angustiante de três mulheres em épocas diferentes, unidas pelo fio invisível da obra Mrs. Dalloway, de Virginia Woolf.

A narrativa entrelaça as histórias de Virginia Woolf (Nicole Kidman) na década de 1920, Laura Brown (Julianne Moore) nos anos 1950 e Clarissa Vaughn (Meryl Streep) nos tempos modernos. Cada uma delas enfrenta crises existenciais que transcendem o tempo, criando uma tapeçaria emocional rica em melancolia e introspecção. A direção de Daldry, aliada ao roteiro sensível de David Hare, é meticulosa ao delinear a jornada de cada personagem, destacando como o sofrimento e a busca por significado transcendem as barreiras do tempo.

Virginia, confinada no isolamento rural pelo marido Leonard (Stephen Dillane), luta contra a depressão e os delírios que a assombram enquanto dá forma ao romance que será sua obra-prima. Laura, por sua vez, sufocada pelas expectativas de uma vida suburbana perfeita, encontra em Mrs. Dalloway uma válvula de escape para sua insatisfação. Já Clarissa, vivendo em uma Nova York moderna, revisita as sombras do passado enquanto organiza uma festa para seu amigo Richard (Ed Harris), um poeta que enfrenta a morte iminente.

As atuações são o coração de As Horas. Nicole Kidman, quase irreconhecível sob um nariz prostético, desaparece no papel de Woolf, capturando com maestria sua angústia intelectual e emocional. Julianne Moore entrega uma performance contida e devastadora como Laura, enquanto Meryl Streep traz nuances à sua Clarissa, equilibrando força e fragilidade. Cada uma delas carrega o peso de seus personagens com autenticidade, transformando o filme em um verdadeiro duelo de interpretações.

A estética do filme é uma obra de arte à parte. A cinematografia de Seamus McGarvey utiliza paletas de cores distintas para marcar os períodos históricos, do cinza terroso da Inglaterra de Woolf ao azul gelado de Manhattan. A trilha sonora hipnotizante de Philip Glass une as narrativas, amplificando a tensão emocional presente em cada quadro. O design de produção e os figurinos completam a imersão, transportando o espectador para tempos e espaços que parecem simultaneamente distantes e próximos.

Embora impecável em sua execução técnica, As Horas exige paciência e atenção. Sua abordagem introspectiva e ritmo deliberado podem afastar aqueles que buscam uma narrativa mais linear ou dinâmica. No entanto, para os que mergulharem na obra, a recompensa é uma experiência cinematográfica rica em camadas e reflexões.

No final, As Horas é menos sobre respostas e mais sobre perguntas: o que significa ser feliz? Como lidamos com nossos próprios silêncios e sombras? Ao abordar esses temas universais com sensibilidade e profundidade, o filme se estabelece como uma peça de arte atemporal, um retrato fascinante do conflito eterno entre a vida e a morte, a liberdade e a conformidade.

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