Estômago, dirigido por Marcos Jorge, mistura culinária e drama de uma forma hipnotizante. A história acompanha Raimundo Nonato (João Miguel), um homem simples que se muda para a cidade grande em busca de uma vida melhor. Raimundo descobre seu talento nato para a culinária quando começa a trabalhar como faxineiro em um bar, onde suas coxinhas transformam o estabelecimento em um sucesso. Giovanni (Carlo Briani), dono de um prestigiado restaurante italiano, o contrata como assistente de cozinheiro, e Raimundo começa a explorar o mundo da alta gastronomia. Ao mesmo tempo, ele inicia um relacionamento com Iria (Fabiula Nascimento), uma prostituta que se torna seu grande amor.
Estômago acaba sendo um dos filmes de culinária mais envolventes de todos os tempos. Marcos Jorge cria uma narrativa visualmente deliciosa, com frequentes close-ups de pratos sendo preparados que são verdadeiros banquetes para os olhos. A trilha sonora, alegre e sensual, contribui para essa experiência, tornando o filme uma espécie de “food porn”. A culinária não é apenas um pano de fundo, mas sim um personagem vital que transforma a vida de Raimundo.
O filme alterna entre duas linhas temporais: a ascensão de Raimundo na carreira gastronômica e seu tempo cumprindo pena em uma cela superlotada por algum motivo que ainda não sabemos. Essa estrutura narrativa mantém o público intrigado, à medida que tentamos descobrir como Raimundo acabou na prisão. João Miguel entrega uma performance multifacetada, fazendo com que simpatizemos com Raimundo, mesmo quando ele se transforma de um homem ingênuo para um manipulador astuto.
A dualidade das linhas temporais é revelada de forma gradual, mantendo o suspense sobre o crime que Raimundo cometeu. Através de sua relação com Iria, uma prostituta com uma paixão voraz pela boa comida, a trama adquire uma camada adicional de complexidade. A química entre João Miguel e Fabiula Nascimento é palpável, e suas cenas juntos são algumas das mais memoráveis do filme.
Estômago é o primeiro filme solo de Marcos Jorge como diretor, e ele demonstra uma habilidade notável em equilibrar elementos cômicos e de conto de fadas com momentos de tensão e grotesco. As comparações feitas pelo chefe de Raimundo entre corpos femininos e comida adicionam uma camada de desconforto e horror, ajustando o apetite do público ao longo do filme. Essa abordagem única faz com que o longa se destaque não apenas como um filme de culinária, mas como uma obra que explora as profundezas da condição humana através da comida.
As cenas na prisão são particularmente impactantes, destacando a capacidade de Raimundo de sobreviver e prosperar, mesmo nas condições mais adversas. Sua tentativa de transformar formigas e larvas em iguarias para seus companheiros de cela exemplifica sua resiliência e criatividade, além de proporcionar um alívio cômico sombrio.
Apesar de sua aparente simplicidade, Estômago revela camadas complexas de narrativa e personagem, tornando-o uma experiência cinematográfica rica e gratificante. Marcos Jorge estabelece uma base sólida para futuras obras, e será interessante ver como ele continuará a explorar temas de sobrevivência, transformação e paixão em seus próximos projetos.
Em resumo, Estômago é um filme que combina elementos de drama, comédia e horror com maestria, oferecendo uma experiência única que certamente deixa o público com fome de mais. João Miguel brilha no papel principal, e a direção habilidosa de Marcos Jorge garante que cada cena seja um banquete visual e emocional. É um filme que transcende o gênero de culinária e se torna uma reflexão poderosa sobre a vida, o amor e a sobrevivência.