Ray, dirigido por Taylor Hackford, destaca-se principalmente pela atuação precisa de Jamie Foxx, que encarna o lendário músico Ray Charles com uma intensidade e autenticidade impressionantes. Foxx não apenas imita os trejeitos de Charles, mas realmente parece habitá-lo, especialmente nas cenas em que toca piano e canta. Sua performance é o que mantém o filme de pé, mesmo quando a narrativa vacila.
O longa segue os primeiros 35 anos da vida de Ray Charles, começando em 1951, com o músico em busca de um lugar na cena musical de Seattle. A história, pontuada por flashbacks que revisitam sua infância marcada por tragédias, explora sua ascensão ao estrelato, seus relacionamentos tumultuados e sua batalha contra o vício em heroína. Apesar do rico material biográfico, o filme frequentemente cai em armadilhas de clichês, transformando uma trajetória extraordinária em um roteiro previsível e linear.
Hackford parece preso a uma fórmula de cinebiografias que carece de ousadia. Muitos eventos são apresentados de maneira apressada ou superficial, como o impacto do envolvimento de Charles no movimento dos direitos civis ou as complexidades de suas relações pessoais. A estrutura episódica acaba fragmentando o filme, dando a sensação de que estamos assistindo a um resumo de momentos importantes em vez de uma narrativa coesa.
O filme se apoia fortemente na música de Ray Charles, que, felizmente, é extraordinária. Canções icônicas como What’d I Say e Georgia on My Mind dão alma às cenas, mas até mesmo a trilha sonora começa a perder força conforme o filme se alonga. A paixão de Charles pela música é palpável, mas o roteiro não a conecta de forma eficaz com sua vida pessoal e lutas internas, deixando lacunas emocionais.
A decisão de incluir uma sequência de sonho/fantasia em que Ray Charles “recupera” a visão é um dos pontos mais fracos do filme. Essa escolha desnecessária quebra a imersão construída por Foxx e subverte a profundidade emocional do personagem. Embora bem-intencionada, a cena exemplifica a abordagem inconsistente de Hackford na direção.
Com mais de duas horas e meia de duração, Ray sofre com problemas de ritmo. A primeira metade do filme, embora convencional, é mais envolvente, graças à energia de Foxx e à trilha sonora vibrante. No entanto, a segunda metade se arrasta, com subtramas mal desenvolvidas e um tom que alterna entre o melodrama e a monotonia.
No fim das contas, Ray é salvo por Jamie Foxx e pela música de Charles, que conseguem ofuscar os problemas estruturais do filme. Para fãs de Ray Charles, é uma celebração de seu legado musical, ainda que incompleta. Para os demais, pode ser uma experiência exaustiva que, como uma canção que se estende demais, perde impacto antes do fim.