O longa Sofia Foi, de Pedro Geraldo, escrito e pensado com a atriz Sofia Tomic, que é a protagonista, transita muito bem pelo estado da arte de um cinema brasileiro contemporâneo sucinto e que não se prende a definições de gênero. Se a escolha do roteiro é filmar uma aluna da Universidade de São Paulo perambulando pelo campus em um único dia, a resposta estética não é a mais comum e é isso que demonstra por que o filme levou prêmio no FIDMarseille, passando pela Mostra de Tiradentes e Sessão Vitrine Petrobrás.
Conhecemos Sofia em um plano aberto, de cima, passeando com um cão em uma área urbana, porém arborizada, ela entra na mata, amarra o cão e some aos sons de mosquitos e água. O cenário muda e descobrimos que a personagem está em uma situação precária de moradia, que precisa sair de onde está. Sofia vai para a USP e, apesar da pouca incidência de luz natural em boa parte do longa, sabemos que é de manhã e lá ela monta uma mesa e começa a tatuar no saguão de um dos blocos da universidade. As pessoas passam por e pelas suas agulhas, Sofia fala pouco, porém é filmada de muito perto. Em dois momentos em que fala, conta de alguém que conheceu em uma viagem, que tatuou a palavra “impermanência”, com quem teve longas conversas sobre morte e que, em seguida, morreu rapidamente de febre amarela. Sofia conta essa história enquanto tatua outra pessoa, e segue no filme deixando marcas, conversas banais ou alguma coisa da sua presença pela universidade. Ela anda, fuma um cigarro despreocupadamente, toma uma cerveja, conversa muito rapidamente com as pessoas e nunca vai para a sala de aula. O campus da universidade é grande e arborizado, as cenas de Sofia ocupando esse espaço se intercalam com outras de um passado com alguém e de algo que poeticamente pode ser o futuro também. O longa segue pelo resto do dia e adentra a noite, conversas fragmentadas se misturam com a escuridão do espaço e Sofia vai desaparecendo até que reste apenas algumas coisas materiais que ela vai deixando pelo caminho.
Sofia Foi é um estudo de personagem existindo com o espaço físico – incluindo a sua precariedade –, não da cidade de São Paulo mas do que é o campus da USP, brincando com as fronteiras do documentário e da ficção. O longa trata de forma poética o desaparecimento de estudantes dentro daquele espaço sem arriscar opiniões ou denúncias. Aliás, essa última está na brutalidade da cena final contrastada com a presença de Sofia que arrisca esse verbo estar no passado, agora fixada na construção fílmica.