Como não emendar os primeiros acordes de Lust For Life, de Iggy Pop com o monólogo de Choose Life do personagem Mark Renton, tentando se desvencilhar do vício e fugindo da necessidade de se tornar adulto numa sociedade fadada ao fracasso? Mesmo que Danny Boyle tenha começado muito bem com Cova Rasa, foi com Trainspotting que sua carreira deu o salto necessário para tornar-se um dos grandes cineastas dos anos 90. Exatamente por isso que T2 Trainspotting é um das sequências mais aguardadas, afinal, o que aconteceu com Renton, Sick Boy, Spud, Begbie, Diane e cia. depois de duas décadas?
Chegou a hora de encarar a vida, escolhê-la foi o que Renton (Ewan McGregor) fez quando fugiu com a grana que tinha prometido dividir com os amigos há quase vinte anos. Retornando a Edimburgo, ele percebe que não apenas a paisagem urbana mudou – os anos 90 não foram muito fáceis no Reino Unido – mas agora ele sente que a idade cobra que tome posições mais concretas. Ao reencontrar a turma do passado ele percebe que o tempo não foi apenas cruel com ele mas com cada um que continua tentando lidar com seus próprios fantasmas. T2 Trainspotting mantém firme a promessa de propor um retorno ao universo daqueles jovens viciados dos anos 90 e vai além, deixando claro que esse retorno não será indolor e nem por isso menos divertido.
Danny Boyle continua na estética que o consagrou, em T2 Trainspotting ele cria planos que causam comoção, brinca com elementos de cena e objetos de memorabilia. Mark Renton não volta apenas para a sua casa para recuperar aquela chama que queima da necessidade de optar pela vida (mesmo que de forma destrutiva, como era na época) mas para encontrar respostas de como seguir em frente se, aparentemente, nada deu certo. Há um embate de gerações muito interessante no filme, uma discussão bastante pertinente e diferente da proposta do primeiro. Se antes presenciamos o caos na vida de jovens viciados – não apenas de forma niilista mas afetando completamente as vidas próximas a cada um – aqui é a vida adulta que interessa, como uma geração que optou por viver da forma mais ampla e se encontra em situações-limites, tentando sobreviver e achar sentido para toda a filosofia da juventude.
E eles encontram. Há um momento certeiro em que Renton explica a uma jovem o que significava a filosofia do Choose Life e o faz de forma muito competente – mérito do roteirista John Hodge e da matéria-prima do Irvine Welsh – transpondo todas as angústias de viver no mundo atual onde ao invés de TVs e alienação pela mídia, temos a efemeridade das redes sociais e a falsa satisfação de mostrar o que possuímos e de que forma vivemos. Mas não é apenas o personagem de Ewan McGregor que está em boa forma, Spud (Ewen Bremner) é um personagem de destaque nesse T2 Trainspotting conseguindo amarrar as pontas da história de forma ao mesmo tempo divertida e crítica, recriando os laços que uniam os amigos de infância, antes mesmos dos vícios.
Há espaço para todos os antigos personagens em T2 Trainspotting, os conflitos entre eles permanecem e encontram seus rumos de formas que prendem o espectador do início ao fim, assim como a trilha sonora bem planejada em cada cena e a violência característica das relações entre homens querendo provar que apenas eles se entendem entre si. Não vem ao caso problematizar as relações entre os personagens no mundo real, T2 Trainspotting é um retorno ao universo onde nos preparamos para saber como esses personagens se desenvolveram nesse tempo e também nos questionarmos quem somos hoje e quem éramos quando assistimos o primeiro filme. Você decide, escolheu a vida ou outras coisas?