Tristeza e Alegria

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Onde fica o limite entre o autor e obra quando se decide abertamente ficcionalizar e filmar a própria vida? Há quem tenha se dado bem, cineastas como Bergman e Woody Allen, por exemplo, sempre foram conhecidos por usarem elementos pessoais para que seus personagens dialogassem melhor com o público e também tivessem identidade. Mas há quem não se dê bem e acabe perecendo diante das próprias vaidades e infelizmente, esse é o caso de “Tristeza e Alegria”, filme de 2013 do dinamarquês Nils Malmros.
Malmros conta em “Tristeza e Alegria” a situação pessoal que viveu com a doença mental de sua esposa. No filme, o diretor de cinema Johannes (Jakob Cedergren) é casado com a professora Else (Ida Dwinger). O longa já começa de forma sombria com a morte da filha de menos de um ano do casal. Em uma crise maníaco-depressiva Else acaba matando a criança, durante os próximos 90 minutos o longa tem a árdua tarefa de contextualizar a situação e mostrar como isso supostamente teria unido ainda mais o casal.
Existem vários problemas na construção de “Tristeza e Alegria”. Desde o roteiro confuso, em que as elipses no tempo ao invés de darem valor à narrativa, apenas tornam o filme confuso e cheio de pontas. Até a falta de uma boa produção que não soube onde cortar o narcisismo do diretor e colocar a ficção à disposição da trama e não apenas uma forma artificial de relatar uma situação verídica, colocada em ênfase logo nos primeiros créditos do longa.
A grande questão do filme é a doença de Else, a saúde mental feminina realmente é assunto muito sério e delicado para se tratar. Em “Tristeza e Alegria” Else sempre está em segundo plano, mesmo que tudo na história aconteça no entorno dela. Johannes é um personagem construído para perdoar Else, mas do que mesmo ela tem que ser perdoada? Da forma como o marido ri de seus gostos, dos costumes de sua família, das roupas que ela usa? Ou da forma que ele a encoraja parar de tomar lítio, remédio que faz parte do seu tratamento? Talvez sejam esses sentimentos de antipatia que Malmros tenta despertar no espectador, mas faz isso de forma muito precária.
“Tristeza e Alegria” é o produto de uma tentativa de purgação. Percebe-se que Nils tenta conduzir o enredo de uma forma que o espectador, que ouve e vê a história pela primeira vez, não julgue Else e perceba o quanto Johannes é frio e individualista dentro da relação. Mas essa purgação nunca acontece no roteiro e muito menos em cena, sendo que muitas situações que poderiam ser chaves – momentos que Johannes se apresenta como diretor durante a gravação de um filme, recebendo uma premiação em Cannes ou mesmo lidando com Else doente – se tornam peças de um dramalhão digno de uma novela televisiva, deixando claro que nem sempre a vida pessoal do artista é boa matéria-prima para uma obra, muitas vezes deixando claro que ele ainda não sabe lidar com os próprios demônios.

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