“Viajar é útil, exercita a imaginação. O resto é desilusão e fadiga (…)”. Começando com uma citação do escritor francês Céline, dizendo que para viajar é necessário apenas fechar os olhos, afinal tudo é inventado, “A Grande Beleza”, novo longa do italiano Paolo Sorrentino, leva o espectador a um grande passeio à Roma atual – levemente mesclada com a Roma de outras épocas – e as peculiaridades de seus habitantes-personagens, seguindo uma busca através da nostalgia de Jep Gambardella.
Jep é um homem de 65 anos, reconhecido jornalista italiano e famoso principalmente por ter escrito um romance visceral aos 20 anos. “O Aparelho Humano” é considerado como uma das obras-primas da literatura italiana e Jep é constantemente questionado porque nunca mais escreveu. A terceira idade, os questionamentos externos e as próprias dúvidas de Gambardella dão conta de orquestrar a nostalgia que permeia o longa inteiro.
Mesmo que Jep Gambardella seja o personagem principal de “A Grande Beleza”, o grande trunfo do longa é a capital Roma, cidade tantas vezes retratada na história do cinema italiano. A câmera de Sorrentino tem um olhar arquitetônico sobre a cidade e perspicaz quando se trata dos personagens.
Desde os últimos resquícios da Roma pré-cristã até a atualidade, nada escapa das lentes do diretor e dos seus planos ora abertos, ora focados na decadência dos artistas ou desespero dos personagens em busca de sentido para a vida.
Repleto de diálogos inteligentes, completamente irônicos e com toques de acidez, Paolo Sorrentino faz de “A Grande Beleza” uma espécie de tributo à sua Roma, aos cineastas italianos e o movimento de neorealismo desse país, fazendo do seu trabalho – repleto de metáforas e elementos fantásticos – quase que um retrato fiel de uma atualidade que beira muitas vezes ao estranho e bizarro. De uma forma mais ousada, Sorrentino fala de sua terra Natal como Woody Allen faz com com Nova Iorque, usando a ironia e a intelectualidade dos diálogos de Jep uma ferramenta eficaz no enredo.
As fortes raízes religiosas da cidade, imigração, obras de arte, a arquitetura que atravessa pelo menos dois milênios e ironias, tudo isso circundando a vida de um único homem, são elementos apresentados sempre em forma de espetáculos que acabam por satirizar o que tentam demonstrar. As pessoas que convivem com Jep – assim como ele – festejam, omitem e principalmente, fingem se divertir com suas vidas tediosas.
Além da ótima direção de Sorrentino, que passou um tempo longe da Itália e retorna com um olhar crítico sobre sua terra natal, o filme conta com ótimas atuações, principalmente a de Toni Servillo (Jep) que em muitos momentos parece não fazer esforço para interpretar as suas próprias angústias. A trilha sonora que ora serve como ambientação – sempre que possível há operetas dando um ar épico à cenas com planos abertos mostrando Roma ampliada – ora com uma trilha sonora eletrônica e dinâmica, mostrando as grandes festas onde os personagens podem simplesmente libertar as suas fugas da vida real.
“A Grande Beleza” foi escolhido para representar a Itália ao Oscar de melhor filme estrangeiro e já faz parte da lista de semifinalistas para o prêmio. Talvez o longa não seja um enredo rápido de se digerir, mas vale cada momento de atenção, seja pelas homenagens ao cinema italiano, seja para se descobrir qual a grande beleza da vida, que tem um significado universal. Bem provavelmente você vai entender as respostas encontradas por Jep Gambardella.