A Linha

Onde assistir
"A Linha": O amor que você recebe da sua mãe quando criança determina como você enfrenta a vida na fase adulta

Aqui vão algumas informações rápidas sobre o filme:

  1. O filme é um drama suíço com paisagens invernais.
  2. Foi dirigido por uma mulher, Ursula Meier, considerada um expoente criativo da sua geração.
  3. A Linha foi selecionado para o Festival de Berlim, um dos melhores do mundo.
  4. É indicado para quem gosta de psicologia e assuntos familiares.
  5. O longa toca em assuntos como sonhos frustrados, relações familiares desgastadas e violência doméstica.
  6. São 101 minutos intensos que te fazem refletir sobre a vida!

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Depois de uma briga violenta com a mãe, Margaret é sentenciada a uma medida restritiva e precisa manter pelo menos 100 metros de distância da casa da família. A filha caçula é encarregada pela mãe de PINTAR UMA LINHA representando o LIMITE em volta da casa, o que apenas INTENSIFICA o DESEJO de Margaret de ficar perto da família. Ao se aproximar da linha todos os dias, sua teimosia reflete os conflitos desta família disfuncional.

O JEITO “EUROPEU” DE SE FAZER CINEMA

Quando pegamos filmes americanos para assistir percebemos que a escolha do cenário, ambiente, cidade ou região, tem muita importância na história. Vamos lá:

  • Filmes que se passam em Nova Iorque dificilmente funcionariam em Los Angeles. E filmes no Texas dificilmente funcionariam no Havaí. Os personagens vivem e representam suas cidades.
  • De um jeito ou de outro descobrimos que a lei daquele lugar (cidade ou Estado) pode atrapalhar ou facilitar a vida dos personagens.
  • As tradições nacionais ou daquela região onde se passa a história, servem de guia para os eventos que irão se desenrolar (Ação de graças, Dia das bruxas, Dia da Independência, etc.)
  • Sotaques são usados para distinguir um personagem, como o texano (caipira, selvagem, bruto) e o britânico (rígido, elitista, clássico, sedutor).
  • Estereótipos visuais caracterizam outsiders, como latinos ou negros.

Esse jeitinho americano de contar histórias baseado em clichês funciona bem, afinal, eles são os chefes da indústria audiovisual. Mas não existe apenas essa forma de se fazer cinema. E os europeus sabem muito bem disso. Eles possuem um outro jeito de retratar seus dramas, sem precisar apelar para comparações externas como sotaques, estilo de roupa, costumes regionais, cidades específicas ou festas sazionais.

Em A Linha, o longa funcionaria em Londres, Roma, Paris ou entre as Montanhas em uma cidade engolida pelo inverno (ONDE DE FATO O FILME SE PASSA). A história nesse tipo de cinema se utiliza de problemas bem específicos, que permitem qualquer psicólogo ilustrar uma situação vivenciada dentro do consultório. A intensidade do drama é maior, pois se baseia em fatos que você ou qualquer um no seu bairro podem viver, ou já viveram.

SE O CINEMA EUROPEU NÃO PRECISA DE LUGARES ESPECÍFICOS PARA CONTAR SUAS HISTÓRIAS, ENTÃO POR QUE FILMAR NO MEIO DAS MONTANHAS?

A Linha poderia ser filmada em qualquer outro lugar e funcionaria bem desde que conseguisse substituir as suas metáforas visuais. Por exemplo, as montanhas e o inverno representam a relação fria e difícil entre mãe e filha. Montanhas sempre simbolizaram desafios e obstáculos, e o inverno sempre foi uma das estações mais difíceis, representando fim, morte e escassez.

Para substituir montanhas e o inverno basta identificar o significado presente neles. Dessa forma você consegue buscar outros lugares que consigam expressar o mesmo. Para os europeus, o cenário serve para reforçar o que os personagens estão sentindo, ou servir como um espelho ao refletir as relações entre os personagens.

“A LINHA” É UM FILME SOBRE PSICOLOGIA?

Sim e não. O sim é porque o tema amor materno é um tema usado em muitos debates desde Freud, tendo gerado quilos de textos a respeito do desenvolvimento de crianças, que recebem ou não recebem atenção e carinho materno. O não porque o filme não se trata de um ensaio, uma tese ou um debate sobre psicologia em si.

CRIANÇAS QUE NÃO RECEBEM AMOR, OU RECEBEM POUCO, SE TORNAM ADULTOS PROBLEMÁTICOS

Isso é o que algumas correntes de pensamento afirmam. Nesse ano de 2023, viralizaram vídeos mostrando crianças de até 2 anos interagindo com brinquedos dados por estranhos. Crianças que receberam amor e atenção dos pais pegam os brinquedos e os exploram com naturalidade. Crianças que tem pais repressores, demoram um pouco para interagir com os brinquedos, e estão sempre buscando com os olhos sinais de aprovação como se tivessem medo de levar uma bronca.

Em A Linha temos uma mãe com comportamentos rígidos e uma filha com comportamentos agressivos. Basicamente é uma criança que não teve a atenção que desejava, já que no filme isso fica implícito. Margaret é impulsiva e passa o tempo todo tentando se reaproximar, numa busca por aceitação contínua.

A LINHA NO FILME VAI MUITO ALÉM DO QUE UM CÍRCULO FEITO DE TINTA

A personagem da mãe é uma musicista que teve o sonho frustrado de ser uma grande profissional, pois acredita ter engravidado muito cedo. Margaret é a criança que interrompeu esses sonhos. Essa mãe possivelmente relacionou a filha como um obstáculo (montanhas), e que trouxe frustrações por anos e anos (o inverno). Há de se refletir que a linha feita ao redor da casa é uma simbologia para a verdadeira linha feita por essa mãe ao redor de si mesma.

A mãe se fecha e não consegue se conectar com sua filha, que cresce tentando se aproximar, até se tornar agressiva por não saber lidar com suas emoções. Ao mesmo tempo que Margareth tenta superar seus problemas, cria uma relação maternal com sua irmã mais nova, despejando nela o que gostaria de receber e nunca teve.

VOCÊ NÃO ESCOLHE OS PAIS QUE TEM OU NÃO TEVE. VOCÊ NÃO TEM CULPA DO AMOR QUE NÃO RECEBEU QUANDO CRIANÇA. MAS QUANDO VOCÊ SE TORNA ADULTO, VOCÊ É RESPONSÁVEL POR RESSIGNIFICAR ESSAS EXPERIÊNCIAS RUINS E SEGUIR EM FRENTE, OU VIVER PRESO NO PASSADO

E é exatamente nesse dilema que Margareth se encontra no filme. É um processo interno da personagem, que a impele sempre para o amadurecimento. A linha representada está ali. Ela foi feita para afastar Margareth. Entretanto, ela insiste em sempre se reaproximar. Contudo, essa reaproximação é uma escolha, não uma obrigação.

Margareth ainda é uma criança ferida no corpo de uma adulta, que reproduz comportamentos espelhadas de sua mãe. Margareth busca em outros relacionamentos o amor que acredita nunca ter recebido. Sem perceber, A linha também foi feita por Margareth dentro do que ela acredita ser seus próprios limites.

VALE A PENA VER “A LINHA”?

O filme possui cenas que podem despertar traumas em muitas pessoas. No fundo somos adultos abrigando crianças feridas. Porém, mesmo com esses traumas que podem aflorar, é interessante observar como uma personagem fictícia age e reage em situações próximas do real. O filme serve como lição para os que buscam amadurecer, repertório para os terapeutas, ou uma história dramática para os afortunados que desconhecem rejeição familiar.

Independente do motivo, assistir A Linha é uma boa escolha para esse fim de ano. Especialmente quando a tendência é juntar a família no Natal e Ano Novo. Talvez a história de Margareth e sua mãe traga um novo olhar para aquele parente problemático. Ou para você mesmo.

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