Adivinhe Quem Vem Para Jantar surgiu como uma das primeiras grandes produções de Hollywood a tratar diretamente do tema do casamento interracial. Em plena efervescência dos movimentos pelos direitos civis nos Estados Unidos, o filme se propõe a discutir o racismo estrutural com um verniz de comédia dramática e um elenco estelar. A história se passa em um único dia, quando um respeitável casal liberal precisa lidar com o choque da notícia de que sua filha pretende se casar com um homem negro.
A condução da narrativa parte de um lugar aparentemente confortável: os pais da jovem Joey se orgulham de suas ideias progressistas, mas enfrentam uma realidade que os obriga a colocá-las à prova. É nesse contraste entre discurso e prática que o roteiro encontra sua força inicial. O personagem de Sidney Poitier, o Dr. John Prentice, é construído como irrepreensível, moralmente íntegro e profissionalmente exemplar — quase como um desafio impossível de recusar.

No entanto, essa escolha também revela uma das limitações do filme. Ao tornar John quase perfeito, o roteiro evita qualquer nuance mais espinhosa sobre o preconceito racial. Ele não ameaça, não provoca, não confronta: sua presença é suavizada ao extremo para que o embate se concentre apenas no desconforto da família branca. A tensão real que poderia emergir da situação é assim diluída, substituída por um idealismo um tanto amenizado.
Ainda assim, Adivinhe Quem Vem Para Jantar encontra momentos de grande emoção, principalmente nos diálogos entre Christina (Katharine Hepburn) e Matt (Spencer Tracy), que protagonizam as cenas mais penetrantes. A despedida emocional de Tracy — em sua última performance no cinema — é um momento particularmente tocante, carregado de autenticidade e humanidade. A relação entre os dois personagens oferece uma espécie de espelho do que o amor pode ser, além das barreiras do tempo ou das convenções.
O filme é também um retrato do que se entendia por progresso em meados dos anos 1960. A estética clássica e o tom polido contrastam com a urgência dos temas, como se Hollywood ainda precisasse suavizar qualquer discurso mais direto para torná-lo palatável ao grande público. As tensões raciais existem, mas são amenizadas; os dilemas morais são tratados com delicadeza, por vezes excessiva. O que vemos é mais uma fantasia otimista do que um confronto real com o racismo.

Mesmo assim, Adivinhe Quem Vem Para Jantar teve papel relevante ao colocar a questão interracial no centro da discussão cultural de sua época. Ao escolher tratar o tema com sofisticação e um certo verniz teatral, o filme conseguiu acessar audiências que talvez resistissem a abordagens mais incisivas. É possível criticar sua ingenuidade, mas também reconhecer seu impacto dentro do contexto em que foi produzido.
Hoje, o filme pode parecer datado em suas soluções dramáticas e cauteloso em suas provocações. Mas permanece como registro importante de uma época em transição, quando o cinema começava a se abrir, ainda que timidamente, para debates sociais mais profundos. Adivinhe Quem Vem Para Jantar talvez não tenha ido tão longe quanto poderia — mas foi um dos primeiros a, pelo menos, sentar à mesa.




