Os clássicos exigem muito mais dos seus realizadores porque eles mexem com a memória afetiva de muita gente. Claro que, se um filme relativamente antigo é refeito, muita coisa se leva em consideração, afinal os tempos são outros e a geração, nem se fale. O que era assustador, engraçado e inocente nos anos 90, pode não ter o mesmo efeito em 2020. Pensando em Convenção das Bruxas, um dos filmes que mais fez parte do imaginário de terror infantil para os millennials, a tarefa é igualmente difícil.
O novo filme, dirigido por Robert Zemeckis (De Volta Para O Futuro) e estrelado por Anne Hathaway (Os Miseráveis) traz uma nova roupagem para a história. De que jeito? Bem, primeiro que a trama se passa nos anos 60 em Nova Orleans nos EUA. Porém tanto a época quanto o local escolhido, de nada influenciam no objetivo final. Talvez alguns pontos que estejam implícitos sejam suficientes para justificar essas escolhas, mas faltou profundidade no porquê. Bem, uma das almas do filme é obviamente a personagem de Octavia Spencer (A Cabana), que faz o papel de uma avó carinhosa e muito forte que acolhe seu neto após seus pais terem falecido. Com a ameaça das bruxas em volta de seu neto, ela resolve se hospedar num hotel luxuoso, onde um parente trabalha como chef. Essa questão é o que mais flerta com a escolha da época mencionada anteriormente, afinal uma família negra se refugiando num ambiente totalmente branco e privilegiado seria a melhor opção, já que as bruxas buscam por destruir crianças menos afortunadas que a sociedade não sentirá falta. A crítica a segregação está aí, mas ainda fica no ar a escolha do estado do Alabama em toda a trama que segue.
As comparações são impossíveis de ignorar. A presença de Anjelica Huston no filme original é algo que transcende a tela, já Anne Hathaway pesa no caricato estilo Rainha Branca de Alice no País das Maravilhas, mas faz sua entrega e deixa nítida sua diversão interpretando a rainha das bruxas, apesar do sotaque que se faz difícil de entender durante suas falas e perde o efeito pretendido. Já o momento mais aguardado do longa, a revelação das bruxas na sala de convenções, segue como o ponto mais forte do filme. É o único momento que dá pra sentir que as crianças transformadas em ratos estão de fato, em perigo. O resto, é pura aventura da forma mais otimista possível. O drama das crianças não serem mais humanas é deixado de lado e sem mais nem menos, elas ainda se tornam mais cativantes, espertas e ativas quando estão na forma de ratos. Uma das coisas que tornavam o filme de 1990 assustador, era o fato de que você não conseguia diferenciar as bruxas do resto das pessoas e isso no imaginário das crianças era bem poderoso, além do tom macabro do filme. Aqui em 2020 tudo é mais didático e extremamente parecido com um sonho.
O visual que mistura CGI com atores, foi benéfico para a figura assustadora de Anne Hathaway e tornou a visão do diretor mais parruda, conseguindo atingir um resultado mais imaginativo sem os efeitos especiais e maquiagens de prótese dos anos 90, mesmo assim, fica a dúvida se vale a pena levar a criançada ao cinema para assistir ao filme em tempos de pandemia, mas a certeza é que se o novo Convenção das Bruxas mostra o reflexo da nova geração, é hora de termos um reboot de clássicos que mostrem crianças mais inteligentes e menos infantis.