Tratando de uma masculinidade entediada, Druk – Mais uma Rodada, de Thomas Vinterberg, propõe uma jornada através de uma crise de meia idade vivida por quatro amigos professores, imersos em seus conflitos de classe média dinamarquesa. O filme concorre a duas estatuetas do Oscar de 2021, nas categorias de melhor direção e filme estrangeiro.
Martin (Mads Mikkelsen) é um professor de História no ensino médio que se dá conta que sua vida tem passado muito rápido, enquanto vive um marasmo profissional e pessoal. Além de suas aulas parecerem entediantes, na vida pessoal ele e sua esposa mal dialogam, assim como seus filhos demonstram desinteresse pelo pai. Em um jantar de comemoração do aniversário de um dos amigos, Martin confessa sobre o momento que está passando e durante a conversa todos desabafam. Um dos amigos conta sobre um psiquiatra finlandês que acredita que todo homem (não sabemos se é o gênero ou os humanos em geral) nasce com pouca quantidade de álcool no sangue e que por isso se sente facilmente infeliz. Com uma quantidade extra e diária de álcool o equilíbrio poderia ser facilmente alcançado, trazendo felicidade.
Depois de uma noitada divertida os amigos decidem que vão seguir a lógica do psiquiatra e fazer esse experimento entre eles, já que todos estão insatisfeitos em alguma dimensão de suas vidas. É aí que Druk passa a ter uma agilidade na narrativa, enquanto assistimos cenas dos amigos bebendo escondido na escola, disfarçando garrafas de água e se escondendo nos banheiros, também vemos seus alunos animados, com aulas e treinos ágeis e interativos. Letreiros com a quantidade de álcool aparecem em tela e assim quem assiste espera que em algum momento os personagens passem do ponto.
Os momentos mais interessantes do filme são os ditos experimentos que o grupo faz para justificar o uso de álcool, seguindo a lógica do psiquiatra finlandês Finn Skarderud. Para seguirem as métricas da teoria eles acabam organizando toda uma rotina diária de consumo de álcool e, inclusive, levam bastante à sério. Até que, claro, desejam ultrapassar os próprios limites sem levar em consideração que a infelicidade que acreditam viver passa por muitas vias de suas vidas, afetando outras pessoas.
Em Druk a comédia acontece também pelo trágico, afinal não há como evitar perdas em uma situação em que o abuso do álcool afeta de formas diferentes cada organismo. São evocadas figuras como o político inglês Winston Churchill e o escritor Ernest Hemingway como bêbados famosos e que deixaram algum legado, só foi esquecido de mencionar que um cometeu suícidio e o outro teve vários derrames ao longo da vida, ambos sendo pessoas polêmicas e de difícil convivência. Com o desenrolar do experimento os amigos se sentem confortáveis com seus bons humores e novas visões diante da vida, porém a bebida passa a redimensionar mágoas, depressões e relacionamentos fragilizados.
Há toda uma construção heteronormativa e centrada na figura do homem. É possível compreender que a narrativa de Druk é uma trajetória de catarse para homens diante de suas masculinidades afetadas pela idade e rotina da vida adulta. Percebe-se que os personagens procuram na bebida algum grau de emoção que percebem na juventude de seus alunos. Não é à toa que o filme abre e fecha com imagens de jovens em rituais de bebida e é justamente disso que eles sentem falta, de algum limite sendo ultrapassado.
De forma nenhuma Thomas Vinterberg parece se preocupar em trazer alguma moral, ou até mesmo ética, para a narrativa de Druk. Ao contrário, o filme se desenrola de uma forma bem ao estilo do dogma 95 (movimento que o diretor foi um dos criadores, junto com Lars Von Trier), em que tudo acontece de forma crua e direta, com pouca luz e sem grandes comoções no arco narrativo do protagonista. A aparente apatia de Mads Mikkelsen (que é filmado sempre de muito perto) é essencial para a cena final, que considero até mesmo bonita. Druk é um filme que trata do que está no limite entre o prazer do excesso e o desejo que vive na ideia de algo incontrolável.