O Pequeno Corpo

Onde assistir
“O Pequeno Corpo” é a jornada de uma mãe para salvar a filha presa no limbo dos não batizados

Oi! Aqui está um resumo para você que tem pressa:

  1. O filme é uma história de época que se passa na Itália de 1900.
  2. A longa ganhou muitos prêmios e está sendo muito bem recebido pela crítica especializada.
  3. O friulano, uma língua antiga ainda falada por pouquíssimas pessoas no mundo, foi utilizada durante toda a história.
  4. Laura Samani é a diretora. Alguns críticos a compararam com o lendário diretor de cinema Roberto Rosselini.
  5. São 88 minutos que vão capturar sua atenção de mexer com suas emoções.

QUAL A HISTÓRIA DE “O PEQUENO CORPO”?

Na Itália de 1900, acreditava-se que pessoas não batizadas eram proibidas de entrar no reino de Deus, inclusive crianças. Por esse motivo, a jovem Agata (Celeste Cescutti) parte em uma jornada para batizar sua filha natimorta, libertando-a do limbo dos hereges. Carregando o pequeno corpo de sua filha dentro de uma caixa, Agata conhece Lynx, um garoto misterioso. Juntos partem em uma jornada para ressuscitar a criança, para que após um suspiro seja batizada e conduzida ao paraíso.

O DRAMA DO NÃO NASCIMENTO

Recentemente tive a oportunidade e o privilégio de assistir o documentário brasileiro Incompatível com a Vida, da jornalista e cineasta Eliza Capai, que registrou sua gestação. No doc, Capai descobre que seu filho é incompatível com a vida, e por isso ela terá que fazer uma escolha: abortar ou dar à luz a uma criança natimorta. O filme é de 2023, mais de 100 anos adiante no tempo em que se passa a história do O Pequeno Corpo. Em uma Itália de 1900, exames pré-natais eram ficções das mais difíceis de serem imaginados, especialmente por pessoas tão simples como a personagem principal do longa. Ela não teve a oportunidade da mesma escolha que Eliza Capai, mas ainda assim conseguiu fazer uma: salvar ou não a alma de sua filha natimorta.

É importante ressaltar que na história de O Pequeno Corpo pesam crenças supersticiosas pertinentes à sua época. Em 1900, a maior parte da Itália era um país agrário de analfabetos, que tinham na Igreja o seu guia moral. E é a partir desse guia que Agata toma suas decisões, motivada a salvar o seu pequeno tesouro guardado dentro de uma caixa. Corpos de não batizados não podiam ser enterrados em solo sagrado consagrado pela igreja, e eram castigados a vagar eternamente no limbo. Agata descobre que o santuário de Nossa Senhora de Trava operava milagres, e sozinha decide levar a filha. No santuário, o pequeno corpo voltaria a vida por apenas uma respiração, o suficiente para que fosse batizado, e salvo.

Nos dois filmes nós podemos ver duas mulheres diferentes, uma real e uma imaginada pela diretora italiana Laura Samani, mas com os mesmos sentimentos: um amor incondicional e o a dor pelo não nascimento. Esse drama levou Eliza a produzir seu documentário, que é um espetáculo visual impressionante, e motivou Agata a percorrer caminhos difíceis em busca da salvação de sua cria morta.

O PROCESSO CRIATIVO DE LAURA SAMANI PARA “O PEQUENO CORPO”

Samani é uma jovem diretora italiana de 34 anos. Ela tem chamado a atenção da comunidade artística com sua forma de contar histórias, sendo comparada ao incrível Roberto Rosselini, um dos maiores cineastas da Itália e do mundo. Com o seu O Pequeno Corpo a jovem diretora se consolidou como um dos novos nomes do cinema europeu, chegando a ganhar prêmios importantes em mostras competitivas.

Além de sua narrativa visceral, o que chama a atenção em Samani é o seu processo criativo. Todo artista possui o seu, e esse processo é extremamente pessoal. Para produzir O Pequeno Corpo, Samani retorna para sua terra de origem, a remota e multicultural Friul-Veneza, uma região italiana que faz fronteira com a Áustria e a Eslovênia. A diretora utiliza os próprios moradores da região como atores de seu filme. Só por esse fato ela merece admiração. Poucos sabem a complexidade para se extrair a interpretação de não-atores. É um trabalho que exige muita dedicação e imersão no projeto. E como podemos ver ao longo de 88 minutos, os moradores de Friul-Veneza foram maravilhosos!

Samani conseguiu imprimir verdade, coisa rara em filmes de época. Os locais ainda falam a mesma língua de 1900, o friulano, transformando O Pequeno Corpo em um registro importante de uma cultura secular. Ao se comunicar com os moradores de forma simples, porém intensa, Samani estabelece uma espécie de contrato social, onde a magia realmente acontece. Ao retratar o seu próprio passado, o povo friulano embevece o público com talento. A história é construída todos os dias nos sets, lidando com as particularidades pessoais dos não-atores e descobrindo atores. E tudo isso organizado pelas mãos de Laura Samani, uma maestra que conduz sua sinfonia.

A JORNADA DE UMA MULHER EM UM MUNDO FEITO PARA HOMENS

No mundo pós primeira guerra mundial, as mulheres possuíam menos direitos e muitos deveres, a maioria pautada em preceitos morais e religiosos. A jornada de Agata era realizada por homens, pois as mulheres ficavam muito fragilizadas após o parto, visto que ainda era considerado de alto risco naquela época. Mesmo assim, Agata parte sozinha, enfrentando os perigos e julgamentos de uma sociedade patriarcal. O Pequeno Corpo é um relato de rebeldia feminina, onde o papel da mulher era o de esperar dentro de um quarto, e o do homem de levar o corpo do natimorto dentro de uma caixa. O filme nos dá a possibilidade de imaginar como seria a inversão desses papéis.

VALE A PENA ASSISTIR “O PEQUENO CORPO”?

Sim! Vale cada centavo gasto no cinema! É um filme que nos toca emocionalmente, nos fazendo vibrar por Agata. Que Laura Samani continue nos agraciando com seu talento e sua visão única de contar histórias.

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