O universo de Sherlock Holmes está na mira das adaptações para o cinema e para tv há bastante tempo, desde os filmes com Robert Downey Jr. até a recente “Enola Holmes”. Os personagens dos livros ganharam muitas versões e agora a Netflix aposta mais uma vez nos adolescentes para tentar alavancar uma nova franquia com um grupo de esquecidos pelo sistema inglês que possuem uma grande responsabilidade.
“Os Irregulares de Baker Street” apareceram pela primeira vez no romance de 1888 chamado “O Signo dos Quatro” que contava a história de crianças e adolescentes das ruas de Londres que viam e ouviam tudo e por isso, eram responsáveis por levar informações do submundo a Holmes e Watson. Na série da Netflix, essa adaptação sofreu algumas mudanças para melhor, a começar pela líder do grupo, Bea (Thadea Graham), uma menina asiática que protagoniza a produção junto com outros atores que também representam diversidade. Essa pegada realista também se estende um pouco ao vocabulário mais moderno e também à trilha sonora que mistura eletrônico com hip hop, mesmo num período vitoriano.
Os Irregulares são como se fossem os “Descendentes” da Disney, que herdam essa missão de investigar assuntos ocultos em Londres para salvar o mundo e são escolhidos por Watson, o parceiro de Holmes, para o início da empreitada. Com essa responsabilidade toda, eles acabam demonstrando uma valentia e autoridade que faz qualquer adulto ficar pianinho perto deles, uma estratégia que é usada nos desenhos animados e filmes infantis desde os anos 80 para que os mais jovens sejam levados a sério pelo seu próprio público. Até aí tudo bem, porque afinal a série deixa bem claro que nesse caso a trama os trata como os escolhidos, assim como é o Harry Potter, um menino normal que de repente se vê envolvido pela maior hierarquia mágica do mundo. Então tudo se justifica sozinho e o andar dos episódios dá conta de manter o interesse vivo nas investigações, nos romances e nos sustos.
Cada personagem ganha um espaço interessante no grupo e tem sua função muito bem descrita, inclusive a série não deixa nenhuma ponta solta de explicação. Até a entrada do príncipe Leopold (Harrison Osterfield) ao grupo, que imprime perfeitamente um jovem James McAvoy, tem uma jornada muito bem estabelecida e clara, de desestabilizar o grupo e contrastar a desigualdade de classes no século XIX. Já o elenco principal adulto deixa a desejar, principalmente Watson, vivido por Royce Pierreson, que não consegue convencer e fica em desvantagem por também ganhar as cenas mais complicadas da série. O Sherlock viciado de Henry Lloyd-Hughes também entra nessa lista injusta de desvantagem por ter a difícil missão de interpretar um personagem tão icônico e sofrer com um roteiro mediano que não prioriza totalmente o personagem e lembra muito o desenvolvimento do mago Merlin da série “Cursed”.
Com belos efeitos e uma trama que não se arrisca muito, a série é uma aposta teen muito bem executada e responsável com seu público, trazendo uma narrativa linear já vista em diversos seriados como “Supernatural” ou “Once Upon a Time”, cheia de conflitos previsíveis, mas todos esses pontos ajudam a série a cumprir seu objetivo de cativar e entreter.