Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro

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“Tropa de Elite 2”: O inimigo agora tem CPF

Tropa de Elite 2 começa como uma continuação direta do filme anterior, mas rapidamente mostra a que veio: mais que expandir o universo de Nascimento, a sequência amplia o escopo da crítica social. Se antes o foco estava na guerra ao tráfico e nos métodos controversos do BOPE, agora o alvo são as engrenagens mais profundas do sistema. José Padilha, novamente à frente da direção, conduz um filme que não apenas aprofunda seu personagem central, mas também mergulha em temas que vão além das favelas — para dentro dos gabinetes.

Com o afastamento forçado do BOPE após uma operação desastrosa, Nascimento ascende à Secretaria de Segurança, ganhando poder como nunca antes. A princípio, sua presença ali parece uma vitória: um homem de ação finalmente com carta branca para combater o crime com inteligência e estratégia. Mas a ilusão de controle não dura muito. A burocracia, a política e os jogos de poder mostram-se mais complexos que qualquer confronto armado, e a corrupção, mais camuflada do que o uniforme preto dos caveiras.

A virada do filme é brilhante justamente porque transforma Nascimento em testemunha e vítima do sistema que ele jurou combater. Se em Tropa de Elite o foco era a brutalidade direta — invasões, interrogatórios, torturas —, em Tropa de Elite 2 é a sutileza das engrenagens corruptas que assombra. A violência continua presente, mas agora como ferramenta de manipulação política, parte de uma engrenagem que gira com naturalidade entre empresários, milicianos e políticos.

Wagner Moura se sobressai ainda mais nessa segunda incursão como Nascimento. Agora mais maduro, menos impulsivo, mas ainda carregando uma raiva que o mundo só parece piorar. O personagem ganha novas camadas: é pai de um adolescente que ele mal compreende, ex-marido de uma mulher que refaz a vida com seu principal opositor ideológico, e funcionário de um governo que só aparenta ser seu aliado. Em cena, Moura é magnético, e sua narração em off — sempre tão característica — ganha aqui um tom mais melancólico e reflexivo.

O filme se equilibra entre o cinema de ação e o thriller político, com uma montagem precisa que dita o ritmo e acentua a tensão crescente. Daniel Rezende, que já havia deixado sua marca em Cidade de Deus, constrói uma narrativa que alterna adrenalina com indignação. As cenas de tiroteio continuam impactantes, mas são os bastidores do poder — os conchavos, as traições, os jogos midiáticos — que realmente disparam a munição mais pesada do filme.

Se por um lado Tropa de Elite 2 pode ser acusado de maniqueísmo, por outro, é inegável sua competência como peça de denúncia. A figura do vilão se desloca do traficante armado para o político engravatado, e o filme não tem pudor em colocar nomes nos bois — mesmo que fictícios. Há um certo prazer narrativo em ver a máscara do sistema cair, ainda que isso aconteça em meio a frases de efeito e uma condução cinematográfica propositalmente apelativa.

No fim, Tropa de Elite 2 é um espelho incômodo — sujo, trincado, mas ainda um espelho. Sua contundência pode soar panfletária para alguns, mas também funciona como uma potente alegoria da falência institucional. O filme não nos oferece redenção ou solução, mas escancara os bastidores do espetáculo. E no Brasil de ontem e de hoje, isso é mais aterrorizante do que qualquer traficante de fuzil na mão.

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