Truman

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A amizade é provavelmente uma das relações mais intensas entre os seres. Mesmo que nos esforcemos para racionalizar as conexões que nos ligam com determinadas pessoas, é impossí­vel mensurar como a empatia e sentimentos relacionados a elas se tornam fundamentais em nosso cotidiano e no sentido que damos à vida. Em Truman, o espanhol Cesc Gay usa da amizade como sentimento fundante e condutor das relações entre personagens que tem que lidar com a iminência da morte e da perda.
A vida afastou Julián (Ricardo Darí­n) e Tomás (Javier Cámara), um vive em Madri e o outro no gélido Canadá. Mas a amizade não os tornou distantes, no momento em que Julián é diagnosticado com um câncer terminal, Tomás vai para a Espanha tentar convencer o amigo a se tratar e continuar lutando. Ele e Paula (Dolores Fonzi), irmã de Julián, tentam lidar com o sentimento de finitude da vida e das relações, cada qual a sua maneira. Já Julián, com um doloroso sentido racional de desprendimento, tenta lidar com o fim se ocupando em deixar todos que ficam das formas mais confortáveis possíveis, incluindo o seu cão Truman.
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É a partir desses sentimentos e relações que Truman constrói um conto sobre grandes amizades em apenas quatro dias. O foco é sempre em Julián e Tomás que – por mérito do roteiro inspirado de Cesc Gay e Tomás Aragay, ora existencialista ora cômico – juntos quebram uma série de clichês de filmes do gênero, e até mesmo do que o espectador espera da amizade de dois homens. A fluidez das atuações entre Darí­n e Cámara é o que conecta o roteiro e o espectador, causando empatia. Há algo de genuí­no na forma que os amigos se cuidam e se relacionam, não há relações de poder e cobrança, apenas um amor sincero.
A câmera é focada nas ações entre os amigos, sempre íntima para que os diálogos sejam bem aproveitados. Seja numa viagem impetuosa para outro país ou mesmo uma conversa inspirada pelo celular, o espectador está sempre com um olhar privilegiado nas cenas. Esse privilégio também tem o seu ônus, que é junto com os personagens lidar com a doença de Julián, os laços que ficam, lembranças que reverberam e o nó na garganta que insiste em ficar.
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Mas apesar da temática que pode parecer trágica e sombria, em nenhum momento Truman deixa de manter um sorriso no rosto ou mesmo uma gargalhada nervosa. Uma das cenas mais interessantes é também uma das mais divertidas: Em um determinado momento Julián e Tomás se veem em uma funerária decidindo os pormenores do funeral, como se comprassem um carro ou uma casa nova, logo são arrebatados pelo sentimento de que tudo faz parte de algum procedimento padrão para alguém. Quem poderia, por exemplo, saber que existem urnas de sal que derretem com as cinzas jogadas ao mar? Ou outra que é feita sob medida e pode ornar com a decoração da casa dos familiares?
Um questionamento que fica durante boa parte do longa é a escolha do título Truman, o nome do cão boxer de Julián. Como um filho, o olhar triste e cansado do cão acompanha os últimos quatro dias entre os amigos. Ele é o elo, muito além de quem fica e de quem vai e proporciona algumas cenas divertidas e mesmo profundas sobre a morte. Graças a Truman os amigos dialogam e entendem suas posições diante da vida, mesmo que o cão permaneça aparentemente apático – quase que um figurante – ele é a representação da fidelidade, do companheirismo e o mais importante, da reciprocidade.
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Truman é um filme sobre antagonismos, como a amizade e seu sentido de eternidade, mas também a morte e o medo de lidar com o desaparecimento do ente querido. Um longa que que nos permite ver além das relações e do cotidiano e perceber que a vida pode fazer sentido em apenas um abraço, uma longa conversa e até mesmo em um único olhar de cumplicidade.
Nota:

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