Foi apenas um pouco mais de um ano antes do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1944, que o mundo soube do que acontecia em campos de concentração como Auschwitz, na Polônia. A guerra já durava cerca de cinco anos e o nazismo se apresentava ainda pior do que parecia nos discursos de Adolf Hitler e nas ações de seus capangas em territórios ocupados. Nunca é demais manter vivas as memórias daqueles que sobreviveram, não só em nome de suas histórias particulares, mas também de todas as pessoas que não sobreviveram. O documentário Um pouco de mim, um pouco de nós, de André Bushatsky, tenta, mais de seis décadas depois, entender como o Holocausto reverbera no mundo contemporâneo.
Partindo de uma breve contextualização histórica, o documentário trabalha com o depoimento de alguns sobreviventes judeus (antes da pandemia de COVID-19), moradores do Brasil, para buscar respostas de como encaramos as crises de refugiados, as guerras e, principalmente, os exercícios de tolerância. Em vez de gente pesquisadora e especialista, a direção opta por trazer em tela nomes como do filósofo Mário Sérgio Cortella e do apresentador Pedro Bial, ambos descendentes de imigrantes. Também, o próprio diretor, André Bushatsky, na Alemanha, junto com a arquiteta Dulcinéia Gomes – que mantém o projeto Conexão Berlim, mostrando a história e arquitetura da capital alemã –, se coloca como a parte de “um pouco de mim” do título, já que é descendente de judeus.
A ideia de Um pouco de mim, um pouco de nós soa interessante: juntar três camadas de narrativas sobre o Holocausto, para culminar na atual situação de imigração pelo mundo. Porém, essas camadas são montadas de maneira bastante confusa, como se faltasse alguma coisa. Não acontece nenhum tipo de coesão entre as partes que poderiam funcionar muito bem sozinhas, menos os depoimentos do Bial e do Cortella, que ficam soltos, soando insuficientes, dando a impressão de que essas duas pessoas foram chamadas apenas por serem famosas. Na outra ponta, os depoimentos de sobreviventes roubam a cena. É bastante incrível ouvir essas pessoas idosas, que sobreviveram a tanto, contando suas histórias com tanta nitidez e força.
O documentário funcionaria bem como um curta-metragem. Com uma boa enxugada e agilidade na montagem, Um Pouco de Mim, um Pouco de Nós poderia ser um ótimo filme-ensaio sobre como a memória é importante para que erros não se repitam, pensando como a história está nas pessoas, na arquitetura e nas narrativas que contamos. Todo mundo tem a responsabilidade de manter as memórias vivas, por mais difíceis que sejam, por isso acho que o documentário deve existir e alcançar o público. Porém, enquanto cinema, é um filme prolixo que ainda soa como um rascunho sem forma.