Uma Mulher Diferente

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"Uma Mulher Diferente": O autoconhecimento como libertação

Uma Mulher Diferente, produção francesa com direção e roteiro da cineasta Lola Doillon, apresenta a vida de uma pesquisadora chamada Katia, de 35 anos, que trabalha em uma produtora de documentários. Ela se destaca no trabalho pela capacidade de desenvolver suas atividades com intensa concentração, não percebendo — ou não se importando — com as coisas ao seu redor.

No início do filme, seu foco é direcionado a pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), pois ela está participando de uma produção com essa temática. É nesse momento que a protagonista, interpretada pela atriz Jehnny Beth, se vê diante de um grande desafio: confrontar-se com o próprio diagnóstico tardio de TEA. A pesquisa acaba promovendo um encontro consigo mesma.

Dessa vez, porém, não será apenas mais um trabalho, pois permitirá à personagem desvelar um mundo até então inédito para ela. Katia descobre que sua personalidade, seu jeito de ser e viver — vistos como excêntricos e diferentes — têm uma designação, uma condição e um nome. Ela percebe que não está louca, mas sente-se simplesmente aliviada por entender quem verdadeiramente é.

O diagnóstico de autismo promove um processo de libertação na pesquisadora, fazendo-a despertar e acolher essa nova e definitiva versão de si mesma. Ao conseguir externalizar seus sentimentos, angústias e modo de ser e viver, Katia passa a ressignificar seu relacionamento com Fred (Thibaut Evrard) e suas relações sociais, familiares e profissionais de outra maneira — com mais autenticidade e coragem.

Um dos destaques do filme é a capacidade de relacionar aspectos ficcionais com a ciência e com a produção do conhecimento sobre o TEA, como um fio condutor que perpassa toda a narrativa e redefine o olhar sobre os personagens e suas relações. Uma das questões apresentadas é a de que o TEA não deve ser entendido como uma doença, mas como uma condição do neurodesenvolvimento. Isso fica evidenciado por meio da personagem Katia, à medida que ela altera a forma como interage com o ambiente ao seu redor.

Outro retrato triste e avassalador é o fato de que mulheres autistas acabam camuflando sua condição em comparação aos homens — o que nos leva a refletir que a sociedade patriarcal acaba nos confundindo e sobrecarregando, sobrepondo dois diagnósticos: o TEA revelado na fase adulta e uma espécie de miopia para a própria vida.

O filme aborda os desdobramentos da descoberta do diagnóstico para além das questões subjetivas da personagem, explorando também o âmbito das relações profissionais — seja com seu supervisor Jeff (Philippe Le Gall), com a colega de trabalho Marie (Irina Muluile) ou com sua mãe, Martine (Mireille Perrier), que resiste em aceitar a condição da filha. Essas relações promovem uma confusão de sentimentos que perpassam a culpa, o fracasso, o medo, a resistência e o acolhimento.

Tratar a complexidade do universo do autismo de maneira simples, de forma a encorajar outras pessoas na busca pela compreensão de suas próprias condições, é uma importante contribuição dessa produção. No entanto, o filme acaba simplificando e reforçando alguns estereótipos da comunidade autista. A mensagem que o longa tenta transmitir é: “Sim, sou diferente das outras pessoas, e isso não me invalida nem me restringe.” Porém, sem a profundidade necessária, o filme busca tratar com leveza um tema complexo, mas acaba esbarrando na superficialidade, transformando-o em uma espécie de conto de fadas do universo do TEA.

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