Alguém Tem que Ceder

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"Alguém Tem que Ceder": Amor fora do roteiro

O amor nem sempre segue o roteiro esperado — e é justamente aí que mora a graça de Alguém Tem que Ceder, comédia romântica escrita e dirigida por Nancy Meyers que desafia os clichês etários do gênero. Ao colocar no centro da história um homem mais velho confrontado por uma paixão improvável por uma mulher da sua idade, o filme convida o espectador a repensar padrões românticos impostos (e replicados) tantas vezes pelo próprio cinema.

Jack Nicholson vive Harry Sanborn, um bon vivant sessentão acostumado a namorar mulheres muito mais jovens. Quando um fim de semana nos Hamptons ao lado da atual conquista (interpretada por Amanda Peet) vira um retiro forçado na companhia da mãe dela — a dramaturga Erica Barry, vivida por Diane Keaton — o destino lhe prega uma peça. Um ataque cardíaco o obriga a repousar sob os cuidados de Erica, e o convívio inesperado desperta sentimentos que vão além do flerte.

Há algo de deliciosamente desconcertante no modo como Alguém Tem que Ceder subverte as expectativas: a figura feminina madura que costuma ser relegada a papel de coadjuvante aqui se transforma na protagonista de uma história de desejo e renascimento. Erica, interpretada com doçura e vulnerabilidade por Keaton, é o contraponto perfeito ao charme egocêntrico de Harry. Ainda que a personagem flerte com traços já conhecidos da atriz — especialmente do tipo neurótica à la Noivo Neurórico, Noiva Nervosa — ela ganha profundidade conforme deixa cair suas defesas.

Nicholson, por sua vez, mergulha de cabeça na autorreflexão. Em vez de suavizar os excessos de seu personagem, ele os abraça: o narcisismo, a insegurança, o medo do envelhecimento. E ao fazer isso sem pudor, humaniza Harry e torna crível a transformação que ele vivencia ao longo do filme. Há uma honestidade cômica e melancólica que perpassa sua atuação — ele expõe o corpo e o ego com igual desarmamento.

Um elemento surpreendente (e bem-vindo) é o charme de Keanu Reeves no papel do médico que se apaixona por Erica. É incomum ver um galã jovem cortejando uma mulher mais velha em tela com tanta naturalidade e respeito — e isso ajuda a ampliar ainda mais o discurso do filme sobre desejo, autoestima e merecimento afetivo, independente da idade.

Se há um pecado em Alguém Tem que Ceder, ele está na duração: o filme se estende mais do que deveria e tropeça um pouco nos momentos finais, com resoluções apressadas e previsíveis. Ainda assim, o caminho até lá é leve, divertido e, em muitos momentos, encantador. Nancy Meyers sabe como poucos construir mundos confortáveis em que o amor parece possível, mesmo quando surge das situações mais improváveis.

No fim, Alguém Tem que Ceder entrega exatamente o que promete: uma história calorosa, com humor, ternura e a coragem de apostar no improvável. É um lembrete de que nunca é tarde para recomeçar — e que, às vezes, o coração sabe muito bem o que está fazendo, mesmo quando o resto do corpo já pede descanso.

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