Capote

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“Capote”: O preço da obsessão

Capote, dirigido por Bennett Miller, é um retrato sombrio de como a genialidade pode consumir a alma de um artista. O filme acompanha a criação de A Sangue Frio, obra-prima de Truman Capote, explorando as complexas camadas da personalidade do autor e o impacto devastador que essa jornada teve em sua vida. É tanto um estudo de personagem quanto uma reflexão sobre os custos da ambição e da obsessão.

A história começa em 1959, quando Capote (Philip Seymour Hoffman) se depara com o brutal assassinato de uma família no Kansas. Decidido a transformar o caso em um marco da literatura de não-ficção, ele viaja ao local acompanhado de sua amiga Harper Lee (Catherine Keener), que estava prestes a lançar seu próprio clássico, O Sol é Para Todos. A abordagem inicial de Capote é estratégica, usando seu charme para ganhar a confiança das autoridades e, posteriormente, dos assassinos, Perry Smith (Clifton Collins Jr.) e Richard Hickock (Mark Pellegrino).

O filme captura a relação entre Capote e Perry com uma profundidade inquietante. O vínculo que surge entre eles é tão humano quanto manipulador, refletindo o conflito interno do autor. Capote enxerga em Perry uma espécie de reflexo distorcido de si mesmo, como ele mesmo sugere: “É como se tivéssemos crescido na mesma casa, mas eu saí pela porta da frente e ele pela dos fundos.” Essa conexão, no entanto, não o impede de desejar o fim da vida de Perry para poder concluir seu livro, revelando uma dicotomia moral devastadora.

Philip Seymour Hoffman entrega uma performance transformadora, encarnando Capote com uma autenticidade que transcende a imitação. Ele captura a voz, os trejeitos e, acima de tudo, a complexidade do escritor, tornando-o um personagem ao mesmo tempo fascinante e repulsivo. Embora o elenco de apoio, especialmente Catherine Keener e Clifton Collins Jr., seja excelente, este é um filme de Hoffman do início ao fim.

O roteiro de Capote é um estudo de nuances, evitando moralizações simplistas. Ao invés de oferecer respostas fáceis sobre questões como a pena de morte, o filme opta por explorar a relação entre os personagens e o impacto que suas escolhas têm em suas vidas. Essa abordagem humaniza a narrativa e mantém o espectador imerso na tensão psicológica.

Embora o filme seja mais cerebral do que emocional, ele permanece com o público muito depois dos créditos finais. A desconfortável honestidade com que retrata Capote como alguém disposto a sacrificar qualquer coisa por sua arte, até mesmo sua humanidade, é profundamente marcante. É um lembrete do preço que muitas vezes acompanha a busca pela grandeza.

Capote é uma obra de peso, tanto como cinebiografia quanto como reflexão sobre a complexidade humana. Ele não apenas conta uma história, mas desafia o público a confrontar questões éticas difíceis, deixando uma impressão duradoura. Um filme obrigatório para quem aprecia um cinema que provoca e instiga a reflexão.

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