Crônicas do Irã

Onde assistir
“Crônicas do Irã” traz esquetes do dia a dia na cidade do Teerã, mostrando os embates entre ocidente e oriente em situações cotidianas.

O termo “esquete” normalmente se refere a algum tipo de cena curta e cômica. É estranho dizer que as histórias narradas em Crônicas do Irã são cômicas, já que cada uma das histórias traz embates cotidianos e sérios, vividos por pessoas comuns, moradoras da capital Teerã. Porém, talvez seja esse limite entre o dramático e o cômico que a direção e roteiro de Ali Asgari e Alireza Khatami queiram apontar para quem assiste ao filme.

 

Crônicas do Irã é formado por várias histórias curtas, quase vinhetas, intituladas pelos nomes de seus protagonistas. Filmado em espaços privados, alguns pertencentes a instituições públicas, o longa mostra pessoas sendo inquiridas, porém sem nunca mostrar seus inquiridores, apenas ouvimos suas vozes. As pessoas que encaramos são comuns, de classes sociais diferentes, mas que são afetadas da mesma maneira pelos mecanismos de regulação de um Estado e sociedade não laicos, como é o caso do Irã. Casos burocráticos como o de um homem jovem querendo registrar o filho com um nome ocidental, ou de outro que, para garantir um emprego, precisa provar que é um islâmico xiita, assustam pelo tom severo que os inquiridores escalam nas conversas pouco dialógicas e repletas de frases de efeito burocráticas e violentas. Por outro lado, situações envolvendo mulheres, como a de uma entrevista de emprego que ao mesmo tempo que o entrevistador (dono da empresa) diz que ela é “velha” por não estar casada com trinta anos, também a assedia pedindo que tire o hijab (véu obrigatório), já que está em um ambiente privado, revelam o assédio e misoginia que conhecemos muito bem no ocidente.

Aliás, as histórias de Crônicas do Irã são equilibradas em relação ao gênero, no sentido binário, porém deixando a desejar na possibilidade de histórias com pessoas LGBTQIA+, que com certeza existem. As crônicas tentam dar conta, inclusive, da infância, em uma das melhores esquetes com uma menina – fã de música pop, Mickey Mouse e etc – tendo que vestir uma roupa típica para meninas árabes. As mulheres das histórias são de todas as idades e cada uma representa os vários modos de regulação quanto à maneira que o corpo é apresentado diante a sociedade. Aliás, não apenas no caso das mulheres, o corpo tem uma grande centralidade nessas crônicas, incluindo no que considero a melhor das histórias, de um homem que precisa tirar a roupa e mostrar as suas tatuagens para garantir uma carteira de motorista para trabalhar.

O drama e o cômico oscilam em Crônicas do Irã, que é um filme-colagem que nos coloca para pensar enquanto espectadoras ocidentais: estamos percebendo os mecanismos reguladores ou apenas reconhecendo situações disfarçadas que vivemos diariamente por aqui também? O longa abre e fecha com uma vista panorâmica de uma Teerã movimentada, com buzinas e arranha-céus como qualquer grande cidade. Porém, é no tête-à-tête, em salinhas de atendimento e entrevistas que grandes violências são executadas.

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