Depois da Caçada

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"Depois da Caçada": Entre a verdade e o silêncio

Em Depois da Caçada, Luca Guadagnino volta a explorar o colapso de personagens que vivem sob tensão emocional extrema — e, mais uma vez, transforma um drama íntimo em um espetáculo visualmente inquieto. Aqui, ele mergulha na atmosfera fria e intelectual de um campus universitário norte-americano, onde ética, poder e desejo se misturam de forma explosiva. Julia Roberts interpreta Alma Imhoff, uma professora admirada que vê seu mundo desmoronar quando é forçada a enfrentar dilemas morais que colocam em xeque tudo o que ela acredita ser verdade.

A trama começa com a denúncia feita por Maggie (Ayo Edebiri), uma aluna promissora, contra o colega de Alma, Hank Gibson (Andrew Garfield). O caso — um suposto assédio sexual — logo se transforma em um campo minado ético, abalando as relações entre professores, alunos e a própria estrutura de poder da universidade. Guadagnino filma tudo com um olhar clínico, quase cruel, deixando que o desconforto das situações se instale lentamente, até se tornar insuportável.

Roberts entrega uma atuação contida e devastadora, marcada por silêncios, olhares e hesitações. Sua Alma é uma mulher que tenta equilibrar empatia e racionalidade, mas se vê afundando em culpa e confusão moral. Garfield, por sua vez, interpreta Hank com uma arrogância estudada, o tipo de homem que acredita estar acima das consequências. Já Edebiri traz um olhar inquietante a Maggie, cuja juventude e convicção moral contrastam com o cinismo acadêmico ao redor.

O roteiro, porém, às vezes pesa a mão nas camadas de complexidade. Guadagnino não se contenta em deixar a questão central respirar — adiciona um marido ressentido (vivido por Michael Stuhlbarg), segredos do passado e uma trilha sonora que parece competir com o drama. O resultado é uma narrativa que oscila entre o brilhantismo e o excesso, entre o cinema de ideias e o puro virtuosismo estético.

Ainda assim, há momentos de puro desconforto cinematográfico que mostram o cineasta em sua melhor forma: closes sufocantes, enquadramentos que isolam os personagens e uma mise-en-scène que parece aprisioná-los tanto quanto suas próprias consciências. Guadagnino pode ser um diretor exibicionista, mas é inegável que sabe capturar o desconcerto humano com precisão cirúrgica.

À medida que os acontecimentos se desenrolam, Depois da Caçada se torna menos sobre a denúncia em si e mais sobre o peso das decisões — e sobre como cada gesto, por menor que pareça, pode ser interpretado de forma devastadora em um ambiente saturado de moral e vaidade. Alma, frágil e teimosa, emerge como uma figura trágica, incapaz de distinguir verdade e autopreservação.

No fim, Guadagnino não oferece respostas — apenas o eco do que resta quando a integridade se choca com o medo. Depois da Caçada é imperfeito, por vezes inflado, mas também fascinante em seu retrato de uma mulher que se desfaz entre o certo e o conveniente. Um filme que exige desconforto — e talvez seja justamente aí que reside sua força.

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