Pasárgada é a estreia da atriz brasileira Dira Paes (Irmãos Coragem, A Diarista e Pantanal, para citar apenas três trabalhos) como diretora de cinema e, enquanto proposta, é um filme com ritmo próprio e uma estrutura argumentativa que atravessa tanto a crítica – trazendo a questão do contrabando de aves no Brasil – quanto uma poética particular de tempo e observação.
A questão do tempo em Pasárgada se relaciona justamente com a profissão da protagonista, interpretada pela própria Dira, uma ornitóloga. Um trabalho que vai além da observação e se relaciona de perto com a escuta apurada das mais variadas espécies. Irene é uma mulher de mais de cinquenta anos que se apresenta à espectadora como alguém que está sempre fugindo – conhecemos brevemente a sua irmã, por videoconferência, e sabemos que existe uma família que está sempre à espera da ornitóloga. Também sabemos que ela está no meio da mata atlântica a trabalho e que um homem estrangeiro quer que ela encontre um pássaro específico. Nunca fica muito claro por que esse homem quer que ela grave os sons dessa ave. Enquanto essa trama vai se desenvolvendo, vamos nos relacionando com o corpo de Irene (já que ela precisa tanto da escuta e da atenção) atravessando esse ambiente que causa uma espécie de reconexão dela com o que há de tropical no seus genes. Ao conhecer Manuel (Humberto Carrão), o mateiro que sabe falar a língua dos pássaros, Irene vai se confrontar com o cerne do seu trabalho e os motivos que a trouxeram até ali.
Dira Paes, apesar de bastante conhecida por seus papeis na teledramaturgia brasileira, trabalha há quase quarenta anos também no cinema. Aqui podemos vislumbrar um pouco dos seus interesses não apenas como realizadora, mas também se dirigindo, enquanto protagonista. Questões que marcaram a sua carreira, como, por exemplo, a exploração do próprio corpo – e o que a televisão e o cinema desejam de performances de mulheres em tela –, aparecem de uma maneira particular e com resquícios de um processo muito interessante de desenvolvimento de um projeto estético próprio.
Apesar de Pasárgada ter uma proposta instigante de tratar corpo humano e relações com espécies companheiras – como chama a filósofa Donna Haraway –, assim como as nossas ações e comportamento com a geografia dos lugares que habitamos, o filme se perde em não aparar algumas arestas. Algumas vezes soa excessivamente poético, cansando quem assiste, e outras vezes vacila na direção de personagens (menos dos atores e atrizes, mais no direcionamento dos personagens na trama mesmo). Porém, fica perceptível que a atriz, e agora diretora, tem interesses próprios e uma poética a ser trilhada. Vamos aguardar.