Considerado por muitos como uma das melhores comédias da década de 1960 (sendo o último filme em preto e branco até A Lista de Schindler a ganhar o Oscar de Melhor Filme), Se Meu Apartamento Falasse funciona igualmente bem como fonte de humor, drama, e romance. Com performances ótimas de ambos protagonistas (Jack Lemmon e Shirley MacLaine), este é mais um título “imperdível” do currículo do diretor Billy Wilder.
O filme abre com uma dose de comentário social satírico. Existem muitas maneiras de progredir no mundo dos negócios. A forma preferida, que muitas vezes é um mito, é trabalhar muito, por muitas horas. Baxter, no entanto, encontrou uma alternativa – tudo o que ele precisa fazer é fornecer “favores” aos executivos da seguradora onde trabalha. Três deles – Sr. Dobsich (Ray Walston), Sr. Vanderhoff (Willard Waterman) e Sr. Eichelberger (David White) – são casados e procuram um local conveniente onde possam trazer acompanhantes para encontros depois do trabalho.
O apartamento de Baxter é perfeito e eles chegam a um acordo com ele. Em troca de avaliações de desempenho favoráveis, eles usam o apartamento por algumas horas por semana. Quando o chefão, Sr. Sheldrake (Fred MacMurray), fica sabendo do acordo, ele quer entrar. Como os outros, ele tem uma amante e está em posição de realmente ajudar na carreira de Baxter. Logo depois de emprestar sua chave ao Sr. Sheldrake, Baxter sobe na empresa. Mas há uma complicação: a namorada de Sheldrake é a ascensorista Fran Kubelik (MacLaine), uma mulher que Baxter gostaria muito de conhecer. Ela está sendo usada por Sheldrake e Baxter sabe disso.
O elenco de Se Meu Apartamento Falasse parece mais repleto de estrelas hoje do que na época da estreia. O maior “nome” do trio principal era Fred MacMurray, uma estrela importante na época em que o filme foi feito. MacMurray tem as qualidades necessárias para interpretar Sheldrake. Ele é atraente e carismático (de uma forma puritana), então é fácil entender como Baxter e Fran caem em sua lábia. Mesmo sendo um canalha egoísta, é difícil não gostar de Sheldrake, em grande parte por causa da maneira como MacMurray o retrata.
Em 1960, Jack Lemmon era um ator não tão conhecido prestes a se tornar grande. Aqui, ele interpreta o tipo de personagem pelo qual seria lembrado: um homem comum, tímido e autodepreciativo. Independentemente de estar numa comédia ou num drama (e passava facilmente de um para o outro), nunca foi difícil identificar-se com os personagens de Lemmon, e essa qualidade destaca-se na produção. Se Meu Apartamento Falasse rendeu a Lemmon sua segunda indicação ao Oscar (a anterior também trabalhando com Wilder, em Quanto Mais Quente Melhor). Seus papéis mais lembrados, porém, foram alguns anos no futuro.
A menos experiente dos três atores principais era Shirley MacLaine. MacLaine havia chamado a atenção do mundo do cinema dois anos antes como protagonista de Deus Sabe Quanto Amei, e ela ainda não havia conquistado a reputação de “atrevida” que mudaria sua carreira posteriormente. Aqui, ela é atraente e não afetada, interpretando Fran como uma mulher com uma forte força de vontade, mas também com uma profunda vulnerabilidade. Para aqueles acostumados com o trabalho de MacLaine na década de 1980 e além, a performance traz um certo eufemismo. MacLaine nunca exagera, algo que muitas vezes não aconteceu em seu trabalho mais recente, como em Laços de Ternura.
Se Meu Apartamento Falasse funciona principalmente por causa da interação entre Lemmon e MacLaine. Na melhor tradição de romances discretos, há muita química, mas não é necessariamente sexual. O relacionamento deles não se baseia na atração física, mas em suas almas “gêmeas”. Afinal, considere que o elemento definidor para aprofundar sua relação, além de suas brincadeiras amigáveis e flertes despreocupados, é uma tentativa de suicídio. Eles revelam muitas coisas um ao outro durante aquelas 48 horas no apartamento de Baxter, algumas das quais eles não percebem até que eles se separem.
Com dez indicações (e cinco vitórias). Foi a indicação final (e vitória) de Wilder para Melhor Diretor. Ele receberia apenas mais uma indicação, como roteirista de Uma Loura por um Milhão, de 1966. Há quem acredite que Se Meu Apartamento Falasse representa Wilder em sua forma mais completa – oscilando perfeitamente entre a comédia e o drama, sem se emaranhar demais em um ou outro. Eu, particularmente, prefiro Crepúsculo dos Deuses e o já citado Quanto Mais Quente Melhor, mas reconheço que o filme está entre os melhores não apenas na filmografia de Wilder, mas de todos os filmes do gênero.
