The Mastermind

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"The Mastermind": O gênio do fracasso

Há algo de deliciosamente irônico The Mastermind (algo como se aqui fosse “O Mestre do Crime”) ser um filme cujo protagonista está tão longe de ser um gênio do crime. Kelly Reichardt, fiel ao seu estilo minimalista e observacional, transforma o que poderia ser um assalto cinematográfico repleto de glamour em um retrato melancólico da mediocridade masculina — um estudo sobre fracasso, vaidade e desespero. Ambientado na Nova Inglaterra dos anos 1970, o longa usa o pano de fundo da Guerra do Vietnã e das transformações sociais da época para revelar um país e um homem igualmente à deriva.

Josh O’Connor interpreta JB Mooney, um carpinteiro desempregado e sonhador frustrado que decide se reinventar como ladrão de obras de arte. O plano, obviamente, é um desastre anunciado. Reichardt não tem interesse em mostrar o crime perfeito, mas o desmoronamento silencioso de um homem que acredita ser mais esperto do que é. A performance de O’Connor captura essa ilusão com uma mistura de vulnerabilidade e presunção, tornando JB simultaneamente patético e humano.

Como em Esculturas da Vida, o filme anterior da diretora, Reichardt volta a se concentrar nos detalhes banais que cercam a arte — não o ato criativo ou o roubo em si, mas o que acontece entre eles. As cenas do assalto em The Mastermind são desprovidas de qualquer trilha sonora empolgante ou glamour cinematográfico: apenas o som seco de passos, respirações contidas e erros acumulados. É como se a diretora quisesse retirar o mito do “golpe genial” e substituí-lo pela realidade fria e frustrante de uma empreitada mal planejada.

O resultado é um “filme de assalto” sem adrenalina, mas com uma intensidade muito mais humana. JB se afunda em suas próprias decisões, incapaz de lidar com as consequências ou de admitir sua falta de controle. Quando tenta negociar com criminosos de verdade, a situação degringola rapidamente, e o que era um sonho de grandeza se torna um retrato de miséria moral. Reichardt filma esse colapso sem pressa, deixando o desconforto se acumular como poeira sobre os quadros roubados.

Visualmente, o filme segue a estética terrosa e desbotada que é marca registrada da diretora, evocando a mesma textura naturalista de First Cow – A Primeira Vaca da América e Wendy e Lucy. A Nova Inglaterra dos anos 1970 parece um lugar suspenso no tempo — frio, silencioso, opressivo. É nesse cenário que Reichardt encontra poesia no fracasso, revelando que o verdadeiro roubo não está nas pinturas levadas, mas na perda da dignidade de um homem que tenta driblar seu próprio vazio.

Em paralelo, o roteiro insinua as tensões de uma sociedade em mutação: o machismo em colapso, o peso das heranças familiares, as promessas não cumpridas do sonho americano. O assalto é apenas o catalisador para expor tudo o que já estava prestes a ruir. O’Connor, em uma das atuações mais finas de sua carreira, transmite esse caos interno com uma naturalidade quase documental, ecoando o personagem que viveu em La Chimera, outro anti-herói perdido entre idealismo e autossabotagem.

No fim, The Mastermind é menos sobre crime e mais sobre consequência. Kelly Reichardt transforma um roubo de arte em um estudo de caráter e fracasso, recusando a excitação dos filmes de assalto tradicionais e apostando na observação crua da desilusão. O resultado é um filme pequeno, mas de impacto enorme— um lembrete de que, às vezes, a tragédia mais profunda está em tentar ser brilhante num mundo que só devolve mediocridade.

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