Golpe de Sorte em Paris é um retorno de Woody Allen ao estilo sombrio que marcou obras como Ponto Final – Match Point e Crimes e Pecados. Com uma trama repleta de reviravoltas e personagens que parecem saídos de um romance de Patricia Highsmith, Allen nos apresenta mais uma vez sua visão sombria e cínica sobre o amor, a moralidade e, principalmente, o acaso. Situado na charmosa Paris, o filme segue a vida aparentemente perfeita de Fanny e Jean, mas logo revela uma teia de traição, crime e consequências imprevistas.
No centro da história está Fanny (Lou de Laâge), que se sente dividida entre sua vida luxuosa ao lado de Jean (Melvil Poupaud) e o charme boêmio de Alain (Niels Schneider), um escritor de sua juventude. A relação extraconjugal entre Fanny e Alain traz à tona questionamentos sobre amor e felicidade, e é justamente nessa tensão que o filme encontra sua força dramática. Allen conduz a narrativa com a maestria de sempre, equilibrando suspense e crítica social, enquanto os personagens são confrontados com suas próprias ambições e desejos.
Uma das maiores qualidades de Golpe de Sorte em Paris é a maneira como Allen brinca com o tema do acaso. O título do filme, que significa “golpe de sorte”, é uma referência direta à imprevisibilidade da vida, uma ideia que perpassa cada momento da trama. Alain acredita que tudo na vida depende da sorte, enquanto Jean defende que as pessoas criam seu próprio destino. Essa dicotomia entre acaso e controle permeia os diálogos e as ações dos personagens, criando uma atmosfera tensa e imprevisível.
As comparações com Match Point são inevitáveis, especialmente quando o filme se encaminha para seu desfecho. Mais uma vez, Allen nos apresenta um protagonista que se vê em uma situação moralmente ambígua e decide tomar medidas extremas para preservar sua vida confortável. A forma como essa decisão é apresentada, sem grandes dramatizações, mas com uma naturalidade assustadora, remete diretamente à abordagem de Allen em seus melhores trabalhos.
No entanto, diferentemente de seus outros filmes com temas semelhantes, Golpe de Sorte em Paris não é apenas um estudo da culpa e da moralidade. Há uma leveza no filme, uma espécie de humor sombrio que permeia as cenas mais tensas. A trilha sonora, com toques de jazz dos anos 1960, ajuda a criar essa atmosfera de descontração, mesmo quando as ações dos personagens se tornam cada vez mais sombrias. É como se Allen estivesse nos lembrando, a todo momento, da futilidade dos esforços humanos para controlar o destino.
As performances do elenco francês são impecáveis, com destaque para Lou de Laâge, que dá vida a Fanny de forma delicada e complexa. Sua personagem é ao mesmo tempo vulnerável e determinada, dividida entre o conforto de sua vida ao lado de Jean e a paixão avassaladora que sente por Alain. Niels Schneider também brilha como o escritor romântico e idealista, oferecendo um contraponto perfeito ao pragmatismo frio de Jean.
Visualmente, Golpe de Sorte em Paris é um deleite. A fotografia capta a beleza de Paris de forma deslumbrante, mas também encontra espaço para destacar a frieza e o distanciamento emocional dos personagens. A paleta de cores é elegante, refletindo o estilo de vida sofisticado dos protagonistas, enquanto o design de produção cria ambientes que parecem ao mesmo tempo aconchegantes e opressivos.
O que torna Golpe de Sorte em Paris um filme tão memorável é sua capacidade de capturar a essência da tragédia sem perder o humor e a leveza que são marcas registradas de Woody Allen. É um filme que nos faz refletir sobre as escolhas que fazemos e sobre as forças imprevisíveis que moldam nossas vidas. Ao final, fica a sensação de que, por mais que tentemos controlar nosso destino, o acaso sempre terá a última palavra.
Para aqueles que apreciam o trabalho de Woody Allen, Golpe de Sorte em Paris é uma adição indispensável à sua filmografia. É um filme que combina o melhor de suas obras anteriores, trazendo de volta a tensão moral de Match Point e o humor ácido de seus primeiros filmes, resultando em uma experiência cinematográfica envolvente e reflexiva.